Título: REGISTRO LÁ FORA IMPEDE USO POR GRUPOS NACIONAIS
Autor: Vivian Oswald
Fonte: O Globo, 08/01/2006, Economia, p. 29

Governo encaminhará aos órgãos de patente lista de biodiversidade

BRUXELAS. O que aconteceu com o sapo kambô também ocorreu com o chamado cipó-cruz (Arrabidaea chica), ou cajuru e uma variedade de nomes pelos quais é conhecida no Brasil esta planta com amplas propriedades terapêuticas. Suas folhas são um santo remédio para doenças de pele a cólicas intestinais, passando por conjuntivite, hemorragias, inflamação uterina e icterícia. A francesa Serobiologiques Lab S.A. obteve no Escritório Europeu de Patentes (EPO, na sigla em inglês) a patente sobre a invenção que utiliza o extrato desta planta para a produção de cosméticos ou fármacos.

O registro da composição cosmética ou farmacêutica contendo um extrato de andiroba foi concedido pelo EPO ao laboratório francês Laboratoires de Biologie Végétale Yves Rocher em outubro de 1998. O Escritório de Harmonização para o Mercado Interno (Ohim, na sigla em inglês) ¿ órgão europeu responsável por marcas ¿ também concedeu o registro a empresas estrangeiras de nomes de produtos brasileiros. É o caso do açaí, dado a uma empresa alemã; da copaíba, a uma italiana; e da carqueja, a uma suíça.

Vitória brasileira cria jurisprudência na Europa

Com os registros das patentes e marcas concedidos às multinacionais, qualquer empresa brasileira fica impedida de comercializar ou exportar esses produtos. Os casos são inúmeros e difíceis de serem identificados.

Em fevereiro do ano passado, a missão do Brasil junto à União Européia (UE) conseguiu evitar que o Ohim concedesse à empresa japonesa Asahi Foods o registro da marca cupuaçu. A mesma empresa já havia perdido o direito ao uso da marca no Japão e acabou desistindo de registrá-la nos EUA. A vitória do governo brasileiro abre caminho para outras decisões na disputa por nomes de frutos, sementes e árvores do país.

Mas o Ministério das Relações Exteriores quer evitar que os institutos de propriedade industrial sequer autorizem o uso de marcas e patentes desses produtos. Para isso, está preparando, com outros ministérios, uma grande lista relacionando todos os nomes da biodiversidade segundo as classes de produtos.

O documento será distribuído aos institutos de propriedade industrial do mundo inteiro, que terão mais subsídios para julgar a concessão de registros. A idéia é evitar os longos e geralmente caros processos para a cassação.

Em março de 2005, a Índia conseguiu cassar o registro da amargoseira (Azadirachta indica) obtido pela empresa americana Thermo Trilogy. O caso se arrastou por quase dez anos. Por ter sido o primeiro, o caso foi considerado por especialistas um divisor de águas e deve criar jurisprudência. (Vivian Oswald)