Título: COBRANÇAS ESPERAM O PRESIDENTE NO FÓRUM SOCIAL MUNDIAL EM CARACAS
Autor: Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo, 09/01/2006, O País, p. 4

Governo estuda estratégia contra as pressões dos movimentos sociais

SÃO PAULO. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve receber cobranças e muita pressão na visita que pretende fazer à edição do Fórum Social Mundial que acontecerá em Caracas, na Venezuela, entre os próximos dias 24 e 29. O evento, uma espécie de conclave mundial da esquerda e um contraponto ao Fórum Econômico Mundial, de Davos, reunirá presidentes latinos em torno do anfitrião Hugo Chávez. Com a nova configuração política da América Latina, vários grupos defendem que o FSM seja a base de lançamento de um ¿eixo do bem¿, uma ironia ao que o presidente americano, George W. Bush já chamou de ¿eixo do mal¿, que seria formado em torno de Chávez.

Na última edição do FSM, que aconteceu em Porto Alegre, Lula e o PT foram vaiados e Chávez acabou ovacionado. Os movimentos cobraram de Lula e do PT um governo mais à esquerda. Chávez foi aplaudido principalmente pelos ataques a Bush. Até então, Lula era um ícone para o FSM, que foi o ponto de lançamento da própria candidatura petista.

¿ Não há nenhuma proposta de se hostilizar Lula. As cobranças são naturais. Mas o FSM é muito mais que os governantes. Além da solidariedade ao processo venezuelano, marcado pelo antiimperialismo, o foco principal do Fórum Social devem ser os processos antiimperialistas em curso na América Latina, tanto nas manifestações, como a de Mar del Plata, como nas mudanças recentes de vários governos ¿ afirma Maria Luisa Mendonça, fundadora do FSM e membro do Conselho Hemisférico.

Oitenta mil participantes são esperados em Caracas

A edição deste ano do FSM já tem 2.200 atividades inscritas e deverá contar com mais de 80 mil participantes, a maioria de organizações latinas e americanas anti-Bush. Segundo os organizadores, o FSM espera celebrar o chamado ¿processo antiimperialista na América Latina¿, ou seja, o ¿eixo do bem¿.

A assessoria direta do presidente Lula informou que a agenda dele ainda está sendo estudada, mas é possível que a visita aconteça no dia 25. Lula deve seguir depois para Davos. Por enquanto, tanto o governo quanto o PT estudam suas estratégias de participação no FSM. Vários ministros devem viajar a Caracas: Luiz Dulci (Secretaria-Geral da Presidência), Marina Silva (Meio Ambiente), Gilberto Gil (Cultura) e Matilde Ribeiro (Igualdade Racial) estão confirmados. A idéia é destacar no FSM as áreas de cada um, principalmente de Marina Silva, que tem a simpatia dos movimentos sociais latinos.

Já o PT convocou uma reunião para o próximo dia 12, à noite, em São Paulo, para decidir suas estratégias de participação. Vaiado em 2005 por sua suposta mudança ideológica e o apoio ao governo, agora o PT terá que se explicar no FSM sobre as acusações de corrupção. Uma das propostas é que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, lidere um ato em Caracas, para defender o governo Lula e explicar os escândalos de 2005.

O FSM começa oficialmente dia 24 e, no dia seguinte, haverá uma megaconferência, no Centro de Caracas, com mais de 100 mil pessoas que ouvirão Chávez. Em seis anos de edição, o único político com tal privilégio foi Lula. Em 2003, já eleito, Lula fez um discurso pragmático em Porto Alegre, desagradando à boa parte das organizações, que esperavam um governo mais à esquerda.

As principais bandeiras do FSM são muito semelhantes às do chamado projeto bolivariano de Chávez. Os ativistas querem principalmente o fim da Alca, a retirada das bases militares dos EUA no exterior e o perdão das dívidas externas de países pobres, além de reivindicações pontuais, como a invasão do Iraque e o apoio à Palestina.

Entre as estrelas políticas esperadas, estão Evo Morales, presidente eleito da Bolívia, Fidel Castro, de Cuba, e o próprio Lula, além de líderes ou representantes dos demais países latinos.