Título: FÓRUM SOCIAL TERÁ EDIÇÃO EXTRA PARA ANALISAR GOVERNO LULA
Autor: Soraya Aggege
Fonte: O Globo, 12/01/2006, O País, p. 4

SÃO PAULO. O Fórum Social Mundial decidiu organizar uma versão brasileira do evento em abril, em Recife, dedicada exclusivamente ao processo político nacional dos últimos três anos, ou seja, ao desempenho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PT. Um dos fundadores e membro do Comitê de Organização do FSM, Francisco Whitaker, que se desfiliou do PT no último dia 1º e é coordenador da Comissão Justiça e Paz, afirmou que, além de atrair os movimentos sociais brasileiros, o evento terá ampla participação internacional, pois muitos intelectuais e ativistas estrangeiros querem entender o que aconteceu com o governo que prometeu ao mundo acabar com a desigualdade social.

- O processo brasileiro deixou muita gente perplexa, decepcionada. E há a idéia de alguns de que houve uma armação da direita contra o PT. O FSM é o espaço ideal para essa discussão - disse Whitaker.

Os participantes poderão convidar o PT e até o presidente para o debate:

- Sem alianças não é possível vencer eleições? Para vencer é preciso mesmo arrecadar muito dinheiro? Para mudar, é melhor conquistar o Legislativo ou o Executivo? É possível um país da periferia do capitalismo enfrentar o neoliberalismo? O que, afinal, faremos para ter justiça social? - pergunta Whitaker.

No último FSM, realizado em Porto Alegre há um ano, tanto o governo quanto o PT foram incluídos em uma série de atividades e fizeram uma ampla exibição do governo.

- Iremos aos pontos que geraram a perplexidade mundial. Será uma oportunidade histórica de a sociedade avaliar essa experiência. Há também um interesse internacional grande, principalmente dos europeus, que querem saber como foi que as batatas se queimaram.

Fórum lançará campanha igual à de zapatistas

Idéia é ter apenas um plano de governo, sem partido ou candidato

SÃO PAULO. Além de debater o processo petista, o Fórum Social Brasileiro que será realizado em Recife também servirá como base para lançar uma campanha eleitoral inédita no Brasil: sem candidatos nem partidos, apenas com plano de governo, segundo Maria Luísa Mendonça, outra fundadora e integrante do Conselho Hemisférico do Fórum Social Mundial.

A campanha eleitoral é semelhante à que o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) acaba de lançar no México. Na versão mexicana, o Delegado Zero (na verdade o subcomandante insurgente Marcos) percorre seu país em uma moto, nos moldes de "Diários de motocicleta", filme que conta a saga motorizada de Che Guevara. Na versão brasileira, os apelos populares ainda serão discutidos.

Decepcionados com o governo Lula, que ajudaram a eleger em 2002, os movimentos sociais brasileiros e entidades de ponta no FSM, como a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e a Rede Jubileu, resolveram lançar a campanha política própria, sem candidato. Dentro do lema do FSM, "outro mundo é possível", deve ser feita "outra campanha eleitoral".

A campanha tem como meta fazer com que os políticos e os partidos adotem a plataforma proposta, que passa por temas caros aos movimentos, como reforma agrária e política econômica.

Organizadores admitem semelhança com zapatistas

Os organizadores reconhecem que a idéia é muito parecida com a que os guerrilheiros zapatistas lançaram no México, neste ano, também para promover o que eles chamam de "outra campanha". Os zapatistas não querem compor com qualquer dos candidatos à presidência, nem mesmo com Lopez Obrador, da esquerda mexicana, mas construir uma plataforma popular.

- Na verdade, houve uma boa coincidência no Brasil com a campanha zapatista. A idéia geral para o Fórum Brasileiro é mesmo de também fazer "uma outra campanha"- disse Maria Luisa.

O secretário-geral do PT, Raul Pont, disse que irá ao FSM em Caracas neste mês e que também pretende participar do Fórum Brasileiro, mas não gostou da idéia da "outra campanha" nem das análises da experiência brasileira. Pont participa de debates no FSM entre os dias 24 e 27.

- Não temos medo dos movimentos sociais, só acho que eles não podem focar suas críticas apenas sobre o PT. Os movimentos não são coisas puras que têm a verdade nas mãos. E essa história de outra campanha, é contraditória. Se os movimentos não se engajarem, vão eleger os mesmos oportunistas de sempre. Além disso, os movimentos sociais não podem tentar substituir os partidos políticos - afirmou Pont.

Expectativa é reunir 20 mil pessoas no Fórum

O Fórum Social Brasileiro acontece entre os dias 21 e 23 de abril, em Recife. A expectativa é de que o evento reúna no mínimo 20 mil pessoas, segundo Maria Luísa. (Soraya Aggege)