Título: O petróleo é deles
Autor: Ramona Ordoñez/Adauri Antunes Barbosa/Claudio de S
Fonte: O Globo, 12/01/2006, Economia, p. 21

Petrobras escolhe SP para gerir investimento de US$ 18 bi e provoca polêmica no Rio

A Petrobras fará um investimento vultoso na exploração e na produção de gás natural e petróleo da Bacia de Santos: serão US$18 bilhões, bancados pela estatal e por seus parceiros, nos próximos dez anos. A empresa mirou na redução da dependência que o país tem do gás estrangeiro, mas conseguiu entrar em outra polêmica. A unidade de negócios que vai gerir a produção da bacia - área que se estende da Região dos Lagos do Rio ao Norte da costa de Santa Catarina - ficará em Santos, no litoral paulista, que venceu assim um disputa com Niterói. A escolha, declarada técnica pela empresa, gerou críticas de políticos e especialistas que viram nela um cunho político: uma tentativa de ganhar a simpatia do empresariado paulista.

Para o especialista Adriano Pires Rodrigues, do Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE), tecnicamente tanto o Rio como São Paulo poderiam receber essas instalações. Portanto, ele acredita que o critério não foi técnico:

- Acho que a escolha foi política, do PT, para tentar ganhar a simpatia dos setores industriais paulistas para as próximas eleições.

O presidente da Petrobras, Sergio Gabrielli, apontou três motivos para a opção por Santos. Ele ressaltou a logística da cidade e as possibilidades oferecidas para atração de especialistas, e disse que Santos é melhor alternativa entre as existentes. O diretor de Exploração e Produção da estatal, Guilherme Estrella, destacou ainda o "aspecto geográfico". Presente à solenidade de anúncio do investimento, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), que é natural de Santos, foi mais objetivo:

- Essa unidade de negócios será em Santos porque 52% da bacia estão no estado de São Paulo e o estado recebe R$6 bilhões por ano da Petrobras em impostos. Isso vai ajudar a alavancar os investimentos e as perspectivas são as mais promissoras possíveis. Vamos produzir aqui mais do que o Brasil consome hoje de gás. Isso vai gerar mais royalties, mais recursos, mais empregos, mais investimentos e, portanto, alavancar toda economia nacional.

O secretário estadual de Energia, Indústria Naval e Petróleo do Rio, Wagner Victer, estacou que, em linha reta, as principais reservas de petróleo e gás da Bacia de Santos, como o bloco BS-500, estão em frente ao litoral do Rio. Além disso, todo o conhecimento tecnológico de petróleo encontra-se nas universidades e centros de pesquisas do Rio.

- É mais uma facada contra o Estado do Rio e Niterói, local que teria as melhores condições de receber essas instalações, contando com três portos, além do de Angra dos Reis - afirmou Victer. - Espero que a cidade paulista seja somente a sede administrativa, mas que as operações continuem sendo feitas por Niterói.

Victer disse que a cidade fluminense também tem mais infra-estrutura de apoio marítimo para as operações, já que tem os três portos voltados para a indústria do petróleo: o terminal do estaleiro MacLaren, o de Niterói e o da Brasco. O secretário alegou que o fato de companhias privadas, como as multinacionais Maersk Oil e BG, fazerem suas operações da Bacia de Campos por meio de Niterói comprovam as vantagens econômicas e técnicas do município.

- Sem bairrismos, o centro do conhecimento do petróleo é o Rio. Então por que se afastar dele? É preciso saber as razões, para decidir o que é melhor para o país - disse o coordenador dos Programas de Engenharia Oceânica da Coppe/UFRJ, Segen Estefen.

Brasil manterá acordo com Bolívia

Para o professor Saul Suslick, diretor do Centro de Estudos de Petróleo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a decisão da Petrobras foi acertada:

- O objetivo da escolha foi muito centrado, que é implementar a inserção do gás na matriz energética do país. A decisão por São Paulo, o estado que tem a maior demanda, também não deixa dúvida sobre o suprimento. A decisão foi acertada.

Gabrielli disse que a Petrobras criará entre "cento e poucos" empregos diretos em Santos. Em todos os seus projetos, a empresa estima que incentivará 622 mil novos postos de trabalho até 2010. De maneira direta, até 2008 a Petrobras deve contratar dez mil funcionários.

A estatal prevê um aumento anual de consumo de gás natural no Brasil acima de 10%, e estima que a produção da Bacia de Santos chegue a cerca de 30 milhões de metros cúbicos diários até o fim de 2010 - depois de atingir 12 milhões no segundo semestre de 2008. Hoje, são consumidos no Brasil 50 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia, 50% nacionais e 50% bolivianos. Segundo a Petrobras, até 2010 a fatia do gás nacional chegará a até 70% do total.

Amanhã, na reunião do presidente da Bolívia, Evo Morales, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o gás será o principal tema. Grabrielli negou a possibilidade de o Brasil romper os acordos com os bolivianos. O contrato com a Bolívia prevê o fornecimento ao país de 30 milhões de metros cúbicos diários. As jazidas descobertas na Bacia de Santos têm reservas de 419 bilhões de metros cúbicos de gás, que garantem, segundo os cálculos da Petrobras, uma demanda de consumo de 60 milhões de metros cúbicos por dia durante 20 anos.

COLABOROU Claudio de Souza, do Globo Online

EMPRESAS DESISTEM DE CONCESSÕES, na página 22