Título: CÂMBIO SEGURA A INFLAÇÃO
Autor: Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 13/01/2006, Economia, p. 23

IPCA foi de 5,69% em 2005, o menor desde 98, à custa de juro alto e baixo crescimento

O dólar baixo e os juros reais mais altos do mundo não foram suficientes para segurar a inflação no centro da meta fixada pelo governo para o ano passado. Em dezembro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,36% e, com isso, fechou 2005 em 5,69%, informou ontem o IBGE. É uma taxa ligeiramente acima dos 5,1% da meta do governo. Mas bem inferior aos 7,60% do ano passado e a menor desde 1998.

A queda da inflação, segundo o IBGE, foi resultado direto da valorização da moeda brasileira frente ao dólar, que derrubou principalmente os preços dos alimentos. Vários itens, como arroz e óleo de soja, terminaram o ano mais baratos. Os analistas lembram também que o recuo do IPCA reflete a política de juros altos mantidos pelo Banco Central (BC) desde o fim de 2004, cujo efeito colateral foi um baixo crescimento econômico. Pelas previsões mais pessimistas, a expansão da economia pode não ter passado de 2% em 2005.

- Foi uma escolha do BC. Era preferível ter uma inflação maior, de 7,5% por exemplo, se o país crescesse 6% em 2005 - critica Jason Vieira, da GRC Visão, acrescentando que o Brasil perdeu uma oportunidade única. - Desde o início do século XX, o mundo nunca viveu um período de crescimento econômico tão vigoroso com inflação baixa.

Segundo estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia global cresceu 4,3% em 2005. Na média, os países emergentes tiveram expansão de 6,4%. Os analistas hoje estimam um crescimento de apenas 2,1% para a economia brasileira em 2005. Também não é para menos: o país tem a maior taxa real de juros (descontada a inflação) do mundo, com 13,1%. Mesmo assim, em seis dos sete anos do regime de metas de inflação, o BC só acertou no centro de seu objetivo uma vez, em 2000.

Os juros altos tornam os financiamentos mais caros e reprimem o consumo, derrubando a inflação. Em 2005, além de alguns alimentos, também bens de consumo duráveis (normalmente comprados com crédito) tiveram queda de preço. Foi o caso de televisores (-11,05%), microcomputador (-11,14%) e aparelho de som (-1,66%). Eulina Nunes, gerente do Sistema de Índices de Preços do IBGE, lembra que esses itens têm insumos importados e, por isso, caíram de preço junto com o dólar.

Após eleições, tarifa de ônibus subiu 10,44% e pressionou IPCA

O mesmo ocorreu com produtos de higiene e limpeza. O sabonete teve queda de preço de 4,67% e o sabão em barra, de 4,34%. Mas a grande ajuda do dólar veio mesmo na alimentação. O grupo, com peso de 22% no IPCA, fechou o ano em apenas 1,99%, mesmo com a frustração da safra agrícola em 2005, quando o país produziu 112 milhões de toneladas de grãos, contra uma previsão inicial de 134 milhões.

- Não fora a taxa de câmbio baixa, a quebra de safra poderia ter tido um efeito perverso sobre os preços dos alimentos - disse Eulina Nunes.

Por outro lado, o que mais pressionou a inflação foi o grupo transporte. O reajuste da gasolina e a alta nas tarifas de ônibus urbano pesaram no bolso do consumidor. A gasolina subiu 7,76% e foi o quarto maior impacto na inflação de 5,69% do ano. A maior pressão veio da tarifa de ônibus urbano, que subiu 10,44%. A explicação para esse aumento vem do calendário eleitoral. Em 2004, quando houve o pleito para prefeitos, poucas cidades tiveram reajuste nessa tarifa.

- Não sei se podemos falar em sazonalidade eleitoral, mas foi mais ou menos isso que aconteceu. Em 2004, várias prefeituras evitaram reajustar as tarifas de ônibus e isso foi adiado para 2005 - afirmou Eulina.

Também tiveram impacto na inflação os gastos das famílias com empregada doméstica. De carona no reajuste do salário-mínimo, os salários dessa categoria subiram 11,52% na apuração do IPCA de 2005.

Inflação menor para mais pobres em 2005. Educação pesa este mês

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que se refere a famílias de mais baixa renda, com até oito salários-mínimos de rendimento familiar, subiu 5,05% em 2005, menos do que o IPCA.

No mês de dezembro, a inflação recuou (de 0,55% do mês anterior para 0,36%) graças à queda no preço de hortaliças e legumes e a altas menos fortes nas carnes. Também subiram menos os combustíveis. Mas o economista Alexandre Sant'Anna, da ARX Capital, lembra que já há algumas pressões previstas para janeiro e fevereiro, como o reajuste de tarifas de ônibus no Rio (ainda em disputa na Justiça), Belo Horizonte e Brasília, e a alta nas mensalidades escolares.

- Os cursos estão com reajustes entre 7% e 8%, acima da inflação. Mas, neste caso, é uma pressão pontual - diz Sant'Anna.

inclui quadro: o sobe-e-desce dos preços / ipca e as metas do governo