Título: AS nuances da disputa
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 14/01/2006, O País, p. 4

Não há razão para o Palácio do Planalto se regozijar, nem se preocupar, com a pesquisa Pulso Brasil, do Ipsos Opinion de dezembro, que mostra uma pequena recuperação do prestígio do governo na opinião pública. As notas médias dadas ao governo e a Lula tiveram uma ligeira melhora. A pesquisa é feita para assinantes, não para divulgação, e por isso não é registrada no TSE.

Em relação à corrida sucessória, mostra o presidente Lula se recuperando diante do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, mas perdendo mais terreno ainda para o prefeito paulistano, José Serra.

Há quem veja nos resultados dessa pesquisa a razão da súbita agressividade da estratégia de Alckmin, encurtando os espaços políticos e se declarando disposto a deixar o governo em março para disputar a Presidência. Como a escolha do candidato do PSDB será feita por um pequeno núcleo de dirigentes tucanos, ficou a sensação de que Alckmin estaria disposto a enfrentá-los. O governador paulista andou telefonando nos últimos dias para vários deles para deixar claro que não pretende afrontar uma decisão partidária, mas apenas marcar sua posição na disputa.

Lula, que em novembro estava empatado tecnicamente no segundo turno com Alckmin, em dezembro voltou a subir nas intenções de voto sempre que foi comparado ao governador paulista. Alckmin permaneceu no nível anterior. No mesmo período, José Serra, o outro presidenciável tucano, ampliou a vantagem sobre Lula na simulação de segundo turno.

Houve uma piora muito grande do governo de julho para agosto, com a revelação de que o marqueteiro oficial Duda Mendonça recebera pagamentos do valerioduto no exterior; e também com as acusações de Rogério Buratti ao ministro Antonio Palocci. Outro pico de impopularidade foi registrado entre outubro e novembro, pelo efeito de todo o processo da cassação do ex-ministro José Dirceu, e da presença assídua do ministro Antonio Palocci nas CPIs.

A falta de notícias tão ruins para o governo em dezembro já seria razão para que os índices melhorassem, mas há ainda o efeito das festas de fim de ano. As chamadas ¿pesquisas natalinas¿ estão sempre sujeitas a certos desvios, embora não exista um histórico do Pulso Brasil que confirme tecnicamente essa tendência. As pessoas estariam com o espírito mais desarmado nessas ocasiões, e mais preocupadas com os festejos. É preciso aguardar os dados de janeiro e fevereiro, pois essa pesquisa não reflete, por exemplo, os efeitos da entrevista do presidente Lula ao ¿Fantástico¿, no dia 1º de janeiro.

O fato é que depois de duas grandes pioras, o governo respirou, saiu debaixo d¿água. A volta do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, à CPI dos Bingos em janeiro é uma potencial má notícia para o governo, assim como a má repercussão da operação tapa-buracos. Mas há também boas notícias para o governo, como o aumento do salário-mínimo e o pagamento antecipado da dívida do FMI, que pode ser criticado, como já vem sendo, pelos adversários políticos, mas carrega um simbolismo importante para a campanha petista.

As pesquisas de intenção de voto vêm mostrando também que tanto Alckmin quanto Serra são candidatos fortes, e seus resultados não serão suficientes para a decisão do PSDB. Outros dados terão que ser incorporados às análises, como a capacidade de fazer alianças, dentro e fora do partido. Entre os que o conhecem, o governador Geraldo Alckmin tem imagem muito positiva, e se beneficia de um fenômeno que é constatável em históricos de campanha: o candidato que é pouco conhecido, mas com avaliação positiva, quando entra na campanha eleitoral, consegue num primeiro momento deslocar essa imagem positiva para os que não o conhecem. Até levar pancada dos adversários e cristalizar uma eventual rejeição, já cresceu bem. Ele tem o perfil de pegar o voto de quem está insatisfeito com Lula, da mesma forma que Serra, só que Serra tem mais recall.

Tecnicamente, o fato de Alckmin continuar perdendo para Lula no segundo turno não tem qualquer significado em termos de favoritismo. Os outros dados das pesquisas mostram que os dois se equivalem. Um técnico resume assim a situação: quem olhar a ponta do iceberg, vê Serra. Se olhar o que está embaixo, o Alckmin se sai muito bem, em alguns casos bem melhor do que o Serra, como o potencial de crescimento muito maior. E um crescimento do Alckmin na campanha, que é certo, pode ter um efeito dominó positivo.

Serra, ao contrário, tem que trabalhar para manter o nível em que está, com pequena margem de crescimento por ser bastante conhecido. Mas o PFL, que preferia o governador paulista como candidato na eleição de 2002, hoje está convencido de que o prefeito José Serra tem condições de vencer a disputa já no primeiro turno, embora os dados de entendimento do eleitorado e perfil do candidato mostrem que Alckmin continua sendo uma aposta muito boa, com um potencial de crescimento muito grande. Mas se Serra mantiver os níveis de intenção de votos que vem obtendo, pode vencer no primeiro turno.