Título: EMBRAER SUSPENDE PLANO DE FÁBRICA NA FLÓRIDA
Autor: Ronaldo D'Ercole
Fonte: O Globo, 14/01/2006, Economia, p. 29
EUA admitem que expressaram preocupação com Venezuela. Ações da fabricante sobem por reestruturação
SÃO PAULO, WASHINGTON e RIO. A Embraer anunciou ontem a suspensão da construção de sua fábrica na Flórida, um dia depois que o Exército dos Estados Unidos cancelou o contrato com o consórcio liderado pela Lockheed, do qual a empresa brasileira participava, para o desenvolvimento de um novo sistema de vigilância aérea para aquele país. O revés no contrato com os militares americanos, que chegava a US$8 bilhões, ocorreu na mesma semana em que o presidente venezuelano, Hugo Chávez, acusou os EUA de proibirem a Embraer de vender à Venezuela 28 aviões de treinamento militar Super Tucano.
O veto foi virtualmente admitido ontem pelo Departamento de Estado americano. O seu porta-voz, Sean McCormack, disse que a Casa Branca transmitiu ao Brasil as mesmas preocupações manifestadas à Espanha, que também negocia a venda de 12 aviões à Venezuela:
¿ Tememos que a venda de equipamento militar à Venezuela possa contribuir para a desestabilização na América Latina e tornamos essa posição clara aos governos da Espanha, da Venezuela e de outros países na região.
McCormack revelou que a secretária de Estado, Condoleezza Rice, conversou por telefone sobre o assunto, na noite de quinta-feira, com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim:
¿ Eles tocaram nesse assunto, mas não posso revelar detalhes a respeito.
McCormack foi mais claro em relação à transação com a Espanha, dizendo que o governo daquele país foi informado de que os EUA negaram as licenças de transferência de tecnologia americana utilizada em aviões que seriam vendidos à Venezuela. Ele disse que ¿essa ação particular¿ está baseada na Lei de Controle de Exportação de Armas.
Por outro lado, o Exército americano sugeriu que o cancelamento do contrato com a Lockheed poderia ser apenas um adiamento, segundo o secretário-assistente do Exército para Aquisições, Claud Bolton.
Empresa confirma estudos sobre conversão de ações
As más notícias na área comercial, contudo, não afetaram a atratividade da Embraer aos olhos dos investidores. As ações ordinárias (com direito a voto) da companhia registraram ontem a maior alta do índice Ibovespa, que reúne os papéis mais negociados na Bovespa: 6,22%, a R$20,49. Já os papéis preferenciais (que têm prioridade no recebimento de dividendos) subiram 2,77%, a R$23,35.
O motivo foi um vazamento de informações, no jornal ¿Valor Econômico¿, sobre um plano de reestruturação do capital da companhia, pelo qual as ações preferenciais seriam convertidas em ordinárias. A Embraer hoje é controlada por um grupo de três acionistas: os fundos de pensão Previ e Sistel e a Companhia Bozano, cada um com 20% do capital votante.
¿ Para os investidores, a notícia da reestruturação acionária é muito mais importante que o cancelamento do contrato com o exército americano ¿ disse o diretor de Pesquisas da Planner Corretora, Luiz Antonio Vaz das Neves.
A Embraer informou que há tempos realiza estudos ¿relativos à eventual adoção de uma nova formatação para a sua estrutura de capital¿. Mas ressaltou que esses estudos não estão concluídos, inclusive quanto à viabilidade.
Em entrevista à agência Reuters, o diretor-presidente da Sistel, Wilson Carlos Delfino, confirmou que a reestruturação em estudo passaria pela conversão de todas as ações preferenciais.
Para José Roberto Baltieri, analista da Corretora Fator, a reestruturação de capital da Embraer é uma tendência. Primeiro porque os investidores internacionais não estão acostumados com papéis sem direito a voto. E o atual acordo de acionistas, lembrou, expira em julho de 2007.
Os rumores sobre a reestruturação já circulavam no fim do ano passado. Negociações atípicas com papéis da Embraer em dezembro levaram a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a abrir processo para verificar se houve vazamento de informações privilegiadas. Para completar a leva de más notícias, a Embraer informou que entregou 141 aviões em 2005, quatro a menos do que o planejado.
COLABOROU Patricia Eloy
(*) Correspondente