Título: NO CHILE, GONZÁLEZ SE DISTANCIA DE CHÁVEZ
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 14/01/2006, O Mundo / Ciencia e Vida, p. 32

Na antevéspera da eleição chilena, ex-líder socialista espanhol diz que se identifica com Lagos, Bachelet e Lula

SANTIAGO. A expectativa de uma vitória da socialista Michelle Bachelet nas eleições chilenas de amanhã fez com que o debate político de ontem se voltasse mais para o cenário externo do que para a movimentação política nas últimas horas antes da escolha do sucessor de Ricardo Lagos.

O comício de encerramento de campanha ¿ que reuniu quinta-feira à noite mais de 150 mil pessoas e parou o centro da capital chilena, contra apenas cerca de dez mil no ato final do candidato da oposição, Sebastián Piñera ¿ encheu de otimismo a esquerda do país, no momento em que vários países da região optaram por candidatos desta tendência política.

Candidato peruano Humala também entrou no debate

Mas uma entrevista do ex-presidente do governo espanhol, Felipe González, que está no Chile para apoiar Bachelet, trouxe à tona uma outra discussão: de que esquerda se está falando? Perguntado pelo jornal ¿El Mercurio¿ sobre a ¿esquerdização da América Latina¿, González provocou:

¿ Não estou certo de que está ocorrendo uma virada para a esquerda, no sentido como a entendo. Sinto-me próximo de uma esquerda como a representada por Lagos ou Bachelet, inclusive a que representa Lula, mas não me sinto próximo do que aparece como esquerda quando é defendida por Chávez.

O político, que comandou a Espanha entre 1982 e 1996, criticou a verborragia do venezuelano:

¿ Chávez gosta de ser polêmico. Acho que ele não aceita bem que a liderança nacional não deve ser confundida com uma liderança regional ou supra-nacional.

Para o espanhol, o que ¿agora se conhece como esquerda¿ na América Latina é uma ¿onda de rechaço¿ às políticas de Washington.

¿ Mas, quando se olha com uma lupa, dá-se conta que há muitos matizes ¿ disse ele.

Outro fator que fez o debate se voltar para a política externa foram as declarações do candidato à Presidência do Peru, Ollanta Humala, líder nas pesquisas.

¿ Creio que há uma política do governo chileno de prepotência e de se aproveitar da debilidade da classe política peruana. Vamos atuar contra a classe política que, de forma prepotente, irrompe em meu país e tem atitudes de donos da casa.

Recentemente, o Congresso peruano aprovou uma mudança nas fronteiras marítimas entre Peru e Chile, medida que não foi aceita por Santiago. A relação entre os países também piorou após ser revelado que o Chile vendeu armas para o Equador durante a guerra entre este país e o Peru, em 1995.

O Chile também tem problemas externos com outros países que se voltaram para a esquerda. A Bolívia insiste em conseguir uma saída para mar, perdida para o Chile no século XIX. O presidente eleito, Evo Morales, disse que só negociará a venda de gás para o Chile após esta questão ser resolvida. Chávez apoiou.

No plano interno, direita chilena troca acusações

Internamentre, o dia foi de troca da acusações, ainda que não em público, na Aliança para o Chile, de direita. A Renovação Nacional, de Piñera, reclama da pouca participação da UDI (direita pinochetista) na campanha do segundo turno.

No último dia de campanha, um dos principais líderes da UDI, Pablo Longueira, faltou a um encontro oficial com a mulher de Piñera. Fontes afirmam que Longueira ¿ adversário histórico de Piñera, pois ambos disputam a mesma cadeira ao Senado por um distrito de Santiago ¿ pretende ser o candidato da direita às eleições de 2010.

O clima esquentou na direita depois que a última pesquisa divulgada deu vitória de seis pontos percentuais para Bachelet no pleito de amanhã.