Título: NOVA LEI DE FALÊNCIAS SÓ GEROU 70 PEDIDOS DE RECUPERAÇÃO EM RJ E SP
Autor: Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 16/01/2006, Economia, p. 16
Aprovada em junho, regra ainda não beneficia totalmente pequenas empresas
Sete meses após implantada, a nova Lei de Falências, considerada por advogados e economistas uma grande inovação para as empresas brasileiras, ainda engatinha para virar uma prática no país. Desde que entrou em vigor, em 9 de junho do ano passado, houve cerca de 70 pedidos de recuperação judicial - o principal instrumento criado pela lei para as firmas evitarem seu colapso financeiro - nas varas do Rio e de São Paulo. Isso num país com mais de 5 milhões de firmas.
Em outros estados, os parcos requerimentos enfrentam a lentidão do Judiciário. E o dispositivo que permite o parcelamento de dívidas tributárias, que beneficiaria sobretudo pequenas e médias empresas, ainda precisa ser regulamentado.
No seu primeiro ano de vigência, a nova lei, entretanto, reduziu drasticamente o número de pedidos de falência. Segundo a Serasa, foram 9.548 requerimentos em 2005, 30% menos que em 2004 (13.925 pedidos). Para o economista Aloisio Araújo, da Fundação Getulio Vargas (FGV), a nova lei incentivou a negociação direta entre empresas em dificuldade e seus credores.
- Esses acordos não requerem homologação judicial. Há uma movimentação nos escritórios de advocacia e consultorias que não aparece nas estatísticas - diz Araújo, que ajudou a elaborar o texto da lei.
Recuperação judicial pode custar pelo menos R$70 mil
Segundo Araújo, ao definir regras claras sobre a recuperação judicial, a lei é uma referência para acordos extrajudiciais. Outra explicação para a drástica queda no número de pedidos de falência está na própria lei. A nova regra prevê que apenas débitos superiores a 40 salários-mínimos (o equivalente a R$12 mil) podem ser usados para que um credor peça a falência de uma empresa.
- Na lei antiga, qualquer valor servia ao pedido de falência, que era usado como mecanismo de pressão - explica o advogado Jairo Saddi, coordenador do Centro de Estudos de Direito do Ibmec São Paulo.
Saddi lembra que a nova lei, porém, trouxe procedimentos complexos que, muitas vezes, dificultam o acesso das pequenas empresas. E esbarra na lentidão do Judiciário. Em escritórios de advocacia do Rio e de São Paulo, estima-se em até R$70 mil os gastos mínimos com os procedimentos para um processo de recuperação judicial - convocação de assembléias, publicação de editais, contratação de administrador judicial etc.
- A lei em tese é acessível. Mas, na prática, para a padaria da esquina, fica difícil pedir a recuperação judicial - diz Paulo Sérgio Restiffe, do escritório Peixoto e Cury Advogados.
Fábio Astrauskas, da consultoria Siegen, especializada em recuperação judicial, afirma que as empresas com faturamento a partir de R$5 milhões por mês conseguem se beneficiar da nova lei. Ainda assim, diz o consultor, falta informação entre os empresários. O economista Aloisio Araújo lembra que o parcelamento de dívidas fiscais, que está previsto na lei, ainda não foi regulamentado:
- Isso está impedindo que muitas empresas acionem a recuperação judicial.
Seis meses para ter o aval da Justiça
Levaram exatos seis meses para que a empresa paraense MIB - que entrou com pedido de recuperação judicial no primeiro dia de vigência da Lei de Falências - ganhasse o aval da Justiça. A demora atrasou a busca da fábrica por possíveis compradores.
- Entendo que o Judiciário tenha que se adaptar. Mas, para os nossos credores, isso não foi nada bom - conta o diretor-operacional da MIB, Wagner Amorim Berberet.
Com sede em Barcarena, a MIB fabrica máquinas para o setor metal-mecânico e faturou R$17 milhões em 2005. Ela entrou em dificuldades financeiras ao investir R$7 milhões numa expansão. Como o banco demorou a liberar o dinheiro, a empresa usou seu capital de giro e ficou sem caixa para pagar fornecedores. O advogado Nacir Sales viu de perto a via-crúcis da MIB. Ele é membro do Instituto Brasileiro de Recuperação de Empresas, uma ONG criada para acompanhar a implantação da nova lei de falências:
- A resposta judicial não tem a velocidade que o mundo empresarial exige. (L.R.)