Título: UM 'POPSTAR' CHAMADO RICARDO LAGOS
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 16/01/2006, O Mundo, p. 21

Com aprovação recorde de 75%, presidente é ovacionado e multidão pede retorno em 2010

SANTIAGO. A multidão que o esperava era muito maior do que a que duas horas antes recebera a candidata Michelle Bachelet, da situação. Coros de apoio, gritos, apertos de mão, beijos. Ele foi aplaudido por centenas de pessoas ao chegar à sua mesa eleitoral, ao entrar na cabine de votação, ao sair dela e ao depositar o voto. Mulheres invadiram a área restrita a homens. Sebastián Piñera, o candidato oposicionista da direita chilena? Não. A pessoa mais festejada no país no momento do voto ontem foi o presidente Ricardo Lagos, a apenas dois meses do fim de um mandato de seis anos.

A efusividade popular pareceu surpreender o próprio presidente. Muitos eleitores, depois de votarem, aproximaram-se dos repórteres que esperavam Lagos e perguntaram quando chegaria o presidente. E ficaram esperando para saudá-lo, numa manifestação considerada espontânea mesmo por fiscais de eleição da coalizão de direita no local.

"Lagos, amigo, o povo está contigo", foi a saudação que recebeu o presidente à sua chegada. Mas logo o coro mudou para "2010!", ano em que será empossado o sucessor de Bachelet. Era um pedido de reeleição de um político que quebrou todos os recordes de popularidade de um presidente em fim de mandato no país. Numa pesquisa divulgada quinta-feira, Lagos tem impressionantes 75% de apoio. A euforia chegou a fazer com que homens beijassem o político socialista quando retornava ao Palácio de la Moneda.

- Parece que está mudando a cultura da nossa sociedade. Foi claramente um beijo de demonstração de carinho - comentou um jornalista de uma rádio local, como que para explicar a atitude pouco comum por parte da conservadora população chilena.

Lagos termina seu mandato no auge. Depois de ter sido colocado de lado no primeiro turno pela campanha de Bachelet - que temia que os 16 anos de governo da Concertação, a aliança no poder, provocassem um cansaço num eleitorado que buscaria rostos novos no poder - ele foi o grande protagonista desde o início do segundo turno, quando a candidatura Bachelet passava por uma crise.

Lagos já está fazendo as malas e voltará a morar na mesma casa de antes de assumir o governo. E já rejeitou os carros oficiais após a cerimônia de passagem de faixa presidencial: voltará dirigindo seu próprio carro para casa. Sobre a eleição, preferiu não se pronunciar, apesar do sorriso irônico que indicava esperança em Bachelet:

- As celebrações devem se fazer no comando do candidato que vença, não no La Moneda. Creio que o correto é que o presidente vá saudar amanhã (hoje) aquele que tiver ganhado - disse Lagos.

Alguns analistas conservadores aproveitaram para criticar a frase: afinal, perguntam eles, quem ganhou a eleição de ontem foi Lagos ou Bachelet? (R.G.)

Legenda da foto: LAGOS CUMPRIMENTA eleitores após votar: centenas o esperaram na seção eleitoral