Título: Simbólico e real
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 17/01/2006, O GLOBO, p. 12

Pela segunda vez, nos últimos 15 dias, o presidente Lula bate o bumbo com o pagamento antecipado de recursos do FMI que o Brasil tinha à sua disposição para se proteger de crises internacionais. No dia 9, no Palácio do Planalto, ocorreu uma solenidade com a presença do diretor-gerente do FMI, Domingo de Rato. Ontem, o presidente Lula ocupou uma rede nacional de rádio e televisão.

A decisão de antecipar o pagamento dos US$15,4 bilhões, que venceriam em 2007, tem sido tratada como meramente simbólico. Mas o fato concreto é que este gesto traz vantagens reais e objetivas para o país. O Brasil deixará de pagar US$900 milhões de juros nos próximos dois anos, tendo pago, desde 1998, pelo menos duas vezes esse valor ao FMI. Lula afirmou ontem que a decisão indica que o país está menos vulnerável às crises externas.

Para o economista Raul Velloso, a decisão do governo brasileiro tem reflexos externos e internos. Na área externa avalia que o pagamento antecipado gera simpatia nos mercados, na medida em que a decisão é interpretada como um gesto de confiança das autoridades brasileiras no desempenho da economia e na manutenção da responsabilidade fiscal. No plano interno, acredita que o presidente Lula aposta no imaginário popular ao libertar o Brasil do FMI, que sempre foi encarado pela sociedade brasileira como um monstro. De uma certa forma, o presidente procura desarmar as críticas que recebe à sua esquerda, que o acusa de ter mantido uma política econômica considerada neoliberal, de promover mudanças na Previdência que atenderiam ao mercado e de não ter feito um governo de mudanças.

Se é fato que não se pode menosprezar a antecipação do pagamento do FMI, também é verdade que não se deve superdimensioná-la. Raul Velloso lembrou que o governo brasileiro precisa enfrentar a questão dos juros altos. Argumentou que a acumulação de divisas, para reduzir a vulnerabilidade externa, tem um custo elevado, que se manifesta na política de juros. O principal deles é o de impedir um maior crescimento da economia. Por isso, pesará mais no embate eleitoral o debate sobre o que fez o governo Lula, e se o que fez era o possível para reduzir as taxas de juros. Nesse debate, tanto o governo petista quanto o tucano estão no banco dos réus, de acordo com as pesquisas de opinião pública.