Título: EM CAMPANHA
Autor:
Fonte: O Globo, 18/01/2006, Opinião, p. 6
Oprimeiro sinal mais evidente de que o Planalto resolvera deflagrar a campanha da reeleição veio ¿ como sempre acontece nessas circunstâncias ¿ por meio do guichê dos gastos públicos. A operação tapa-buracos ¿ sem entrar no mérito da oportunidade técnica da iniciativa ¿ já faz parte desse movimento político-eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O aparecimento de faixas levadas por militantes a pelo menos uma frente dessas obras foi sugestivo.
Depois, veio o anúncio de um pacote de projetos tão rapidamente confeccionado que dele fizeram parte algumas hidrelétricas ainda sem licenciamento ambiental.
E para tirar qualquer dúvida sobre a inauguração da temporada eleitoral por parte do Planalto, o pronunciamento do presidente Lula, na noite de segunda-feira, por rede nacional de rádio e TV e em horário nobre, foi de quem despudoradamente subiu no palanque. As emissoras, por sinal, não tiveram acesso prévio à fita do discurso, para não utilizarem a fala presidencial como pauta jornalística nos jornais noturnos de grande audiência.
Embora a explicação do Palácio para o discurso em rede formada compulsoriamente ¿ justificada apenas para temas de real interesse da população ¿ fosse a comunicação presidencial ao povo da importância do fim das pendências financeiras com o FMI, a maior parte do tempo foi gasta por Lula em autolouvações eleitoreiras.
Sobre o resgate da divida com o FMI, fora bravatas de praxe, ouviu-se uma curiosa referência à necessidade de, agora, o Fundo prestar contas ao Brasil, como se o país fosse um dos grandes mantenedores da instituição.
O comício eletrônico da noite de segunda serviu de fecho adequado a uma longa programação de visitas a canteiros de obras viárias e discursos atrás de votos entre Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte.
São legítimas as aspirações eleitorais do presidente. Mas é imperioso um cuidado extremo no uso partidário da máquina e dos recursos públicos. Lula já vive a dura experiência do escândalo petista. Não deverá querer reproduzir uma das piores características da política brasileira, a exploração do Estado com objetivos privados. Um presidente da República em campanha precisa dar o exemplo de postura ética e lisura na disputa eleitoral.