Título: SUPERMERCADO PARA O MUNDO
Autor: Mariza Louven
Fonte: O Globo, 18/01/2006, Economia, p. 19

Brasil exporta US$20 bi em alimentos, 18% a mais; vendas no país sobem só 3%

Já é comum encontrar produtos como o chá-mate brasileiro na Rússia; a cachaça, na Alemanha; e a farinha de mandioca, no Japão. Mais do que celeiro, o Brasil está virando um verdadeiro supermercado para o mundo. As exportações de alimentos processados no país ¿ exclui grãos como soja, café, cacau e outros in natura ¿ ultrapassaram os US$20 bilhões em 2005, quase 18% a mais que em 2004, segundo a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia).

Devido à renda mais contida dos brasileiros, porém, as vendas internas de comida cresceram em torno de 3% de janeiro a novembro de 2005 sobre igual período de 2004, totalizando cerca de R$170 bilhões.

¿ Encontro cachaça facilmente nos supermercados onde moro ¿ afirma o empresário Fernando Xavier, que vive na Cidade de Colônia, na Alemanha.

De férias no Brasil, ele encontrou a cachaça Magnífica, no supermercado Zona Sul, em Ipanema, por R$18,50, ou cerca de 6,8 euros.

¿ Costumo comprar lá a Pitu, por 10 a 20 euros ¿ diz.

A diferença de dinamismo entre as vendas de comida nos mercados externo e interno tem explicações como o crescimento mais acelerado da economia e da renda mundial, frente a um ritmo mais lento aqui. Além disso, o Brasil diversificou produtos ¿ agregando itens de maior valor ¿ e desenvolveu mercados, afirma o diretor de Economia da Abia, Dênis Ribeiro.

Hoje, o país é o maior exportador de carne de frango e bovina, açúcar e suco de laranja. Os principais compradores são Rússia, Alemanha, Japão e Estados Unidos. A Garoto, por exemplo, já vende bombons como o Serenata e o tablete Batom para 62 países, segundo seu diretor Comercial, Ubiraci Fonseca.

¿ Não nos interessa exportar só cacau em grão. O produto final gera renda na agricultura, na indústria, na logística e nos transportes, no comércio e até no mercado financeiro ¿ destaca o assessor de Economia e Estatística da Abia, Amilcar Lacerda.

O consumo de alimentos está ligado ao comportamento da economia e da renda, analisa Silvio Sales, chefe da Coordenação da Indústria do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para João Carlos Gomes, da Fecomércio-RJ, o crescimento mais vigoroso da economia mundial dá gás aos preços e demandas externos.

¿ Aqui as vendas podem crescer mais se aumentarem o número de consumidores e a renda ¿ acrescenta Gomes.

Creuza Maria de Freitas trabalha por conta própria e diz que, apesar de os preços dos alimentos não terem subido muito em 2005, ela não mudou o padrão de consumo:

¿ Se lá fora eles estão comprando mais é porque podem. A gente não ¿ diz.

Apesar de problemas com o câmbio e com a febre aftosa ¿ 48 países bloquearam importações de carne ¿ os alimentos processados foram os primeiros da pauta de exportações em 2005. Representaram cerca de 17% do total, acima da indústria metal-mecânica e dos agrícolas.

Os destaques foram as carnes ¿ US$7,4 bilhões até novembro. Os chocolates, de maior valor agregado, renderam US$100 milhões, 21% a mais que em 2004. A Damazonia Chocolates, do Pará, conseguiu levar o seu produto para a Galeria Lafayette, na França.

¿ Nosso chocolate tem 72% de massa de cacau, teor que o eleva à categoria gourmet ¿ explica o proprietário Carlos Ferreira.

Mas enquanto as carnes foram o carro-chefe das exportações, no mercado interno foram vendidas 15 milhões de toneladas, o mesmo que em 2004. Isso também aconteceu com o feijão ¿ 2,9 milhões de toneladas vendidas, igual a 2004. As de laticínios, que segundo Lacerda estavam no mesmo patamar desde 1998, tiveram melhor desempenho, com 24 milhões de litros, 4,2% mais.

Pesquisa da ACNielsen mostra o melhor desempenho, no país, das vendas de lácteos (como iogurte) e frios (presunto e mortadela): ¿os produtos que mais cresceram têm caráter de consumo complementar, o que leva a crer que o poder de compra dos consumidores esteja crescendo¿.