Título: LULA E KIRCHNER QUEREM FORTALECER O MERCOSUL
Autor: Eliane Oliveira e Janaina Figueiredo
Fonte: O Globo, 18/01/2006, Economia, p. 23

Presidentes de Brasil e Argentina vão buscar formas de agradar a outros membros para evitar racha no bloco

BRASÍLIA. Presidentes das duas maiores economias do Mercosul, Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner se reúnem hoje preocupados com uma possível crise, caso se concretize a ameaça feita pelo Uruguai de fechar, sozinho, um acordo comercial com os Estados Unidos. Convictos de que os sócios menores ¿ uruguaios e paraguaios ¿ estão insatisfeitos com o tratamento recebido de brasileiros e argentinos, Lula e Kirchner vão discutir formas de agradar aos parceiros e evitar um racha sem precedentes no bloco. Firmar acordos em separado com terceiros mercados fere o Tratado de Assunção.

Lula e Kirchner deixarão de lado os problemas domésticos, como a questão das salvaguardas e o regime automotivo, em busca de uma aliança política capaz de contornar o atual estado de incerteza em relação ao futuro do Mercosul e seu posicionamento junto às demais nações sul-americanas.

Um ponto que preocupa os dois presidentes é a posição do Chile sobre a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A nova presidente daquele país, Michelle Bachelet, já deixou claro que defende a Alca com fervor, o que agrada aos EUA, mas vai de encontro ao que pensam o Brasil e os seus sócios. A Venezuela e a Bolívia, que pregam o repúdio à política externa americana, também estarão na pauta da reunião bilateral. Brasil e Argentina defendem que as boas relações com os americanos sejam preservadas.

¿ Há uma nova situação na América Latina, marcada por um quadro de dispersão. É hora de pararmos de lidar com políticas de geladeira, fogões e autopeças e passarmos a ter uma visão mais macro ¿ afirmou o embaixador da Argentina no Brasil, Juan Pablo Lohlé.

Para ele, os lados comercial e político do Mercosul não podem mais ficar desvinculados. Isso, em sua opinião, demonstra uma visão subdesenvolvida a respeito da integração.

¿ Os problemas domésticos estão dominando a política externa ¿ disse o embaixador.

Altos funcionários argentinos disseram, em Buenos Aires, que o conflito provocado pela iniciativa do governo uruguaio reflete o alto grau de insatisfação que predomina não apenas entre Uruguai e Paraguai, mas também da Argentina.

¿ A Argentina representa 10% do superávit comercial brasileiro. Não convém ao Brasil pôr em risco o futuro do Mercosul. Todos perderíamos, mas quem mais perderia seria o Brasil ¿ disse um negociador argentino, que integra a comitiva oficial.

Kirchner também aproveitará o encontro para reiterar sua preocupação com o desequilíbrio no fluxo de investimentos na região. Ele quer recuperar o espaço perdido nos últimos anos e atrair mais recursos, hoje destinados aos mercados brasileiro e chileno. Para isso, dizem os argentinos, é necessário negociar políticas comuns e, sobretudo, eliminar incentivos aplicados pelo governo brasileiro.

O subsecretário para assuntos da América do Sul do Itamaraty, José Eduardo Felício, admitiu que, em algum momento, Brasil e Argentina terão de incluir o Paraguai e o Uruguai na lista de salvaguardas do Mercosul.

COLABOROU: Patrícia Duarte