Título: Caldo escuro
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 20/01/2006, O GLOBO, p. 2

É bastante provável que na próxima quarta-feira, dia 25, a Câmara aprove a emenda constitucional que acaba com a exigência de coligações verticais. A regra que, na prática, proíbe os partidos de fazerem nos estados coligações diferentes das que tenham feito para a disputa presidencial. Afora o PT e o PSDB, os demais partidos estão agora mais preocupados com a sobrevivência. Se tal acontecer sobrevirá uma disputa jurídica que paralisará o jogo.

Talvez seja até bom. A disputa prematuramente instalada deu mostras de sua radicalização ontem no Senado, onde a antiga fidalguia deu lugar, não é de hoje, a arruaças verbais. Do jeito que vai, ainda sairão tiros ali. Certo é que, se o Congresso aprovar a tal emenda, estará, ainda que por alteração constitucional, violando o artigo 16, que proíbe mudanças nas regras eleitorais a menos de um ano do pleito. Isso feito, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) argüirá a inconstitucionalidade da medida. Outras contestações certamente surgirão. E até que o STF e o TSE deliberem sobre o assunto, partidos e candidatos terão que pisar no freio. Pelo menos de alianças não poderão tratar até que venha a palavra definitiva sobre o tipo de coligações que será permitido.

No final do ano passado os partidos que advogam o fim da regra imposta pelo TSE em 2002, temendo uma derrota, evitaram a votação. Agora, juntaram mais forças e, segundo o líder do PSB, Renato Casagrande, já teriam 320 votos. São necessários 308. Estão na articulação para votá-la na semana que vem PMDB, PFL, PSB, PCdoB, PPS, PDT, PP, PTB e PV. Ou seja, todos menos PT e PSDB. O PSDB porque, achando-se favorito na disputa, prefere amarrar aliados de cima a baixo. Com verticalização, haverá menos candidatos e o dos tucanos ficará com o papel de anti-Lula . O PT porque quer mostrar que não fará mais alianças com impuros, embora a verticalização seja nociva à candidatura do presidente Lula, limitando suas alianças. Mesmo entre tucanos e petistas há deputados dispostos a apoiar, por razões diferentes, a mudança da regra. Os petistas assim dispostos são mais ligados a Lula e suas necessidades. A decisão favorável à manutenção da verticalização foi encaminhada pela esquerda do PT, mais preocupada com o partido do que com a reeleição de Lula. Já os tucanos são líderes regionais que, sob a regra atual, seriam privados de aliados importantes. De peemedebistas, por exemplo, se o PMDB lançar mesmo um candidato próprio.

Esse é o ponto importante que se segue na agenda política. Aldo Rebelo (PCdoB-SP) assegura que, se na terça-feira a maioria dos líderes pedir, marca a votação. Então, só falta marcar. O alinhamento de todos os partidos contra a posição do PT e do PSDB indica que esta eleição será regida fundamentalmente pela busca da sobrevivência partidária e pela lógica regional, o que costuma embaralhar as cartas mais que o normal. Some-se a isso o sentimento de frustração e desalento político do eleitorado e temos um bom sarapatel, aquele prato em que ninguém sabe o que come.