Título: PIB SEPARA MERCADO E GOVERNO
Autor: Martha Beck e Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 23/01/2006, Economia, p. 14

Analistas apostam até em crescimento inferior a 3% no ano, enquanto Fazenda vê 5%

O crescimento da economia brasileira este ano, projetado pelo governo em 5%, é considerado otimista demais por economistas e consultores ouvidos pelo GLOBO. As estimativas variam entre 2,8% e 4%. No entanto, é unânime a opinião de que haverá um aumento do consumo das famílias (4,2%, segundo o Banco Central) e uma recuperação do mercado interno graças, principalmente, à redução da taxa básica de juros (Selic). A trajetória de queda, que começou em setembro de 2005, foi mantida na última reunião do Comitê de Política Monetária do BC (Copom), na semana passada, que baixou a taxa de 18% para 17,25% ao ano.

¿ Veremos uma recuperação da economia por conta da política monetária ¿ afirma o economista-chefe para América Latina do ABN Amro, Mário Mesquita.

Para o economista-chefe da Global Invest, Pedro Paulo da Silveira, a expectativa do governo em relação ao crescimento da economia ¿ defendida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelos ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan ¿ ¿está totalmente errada¿. Para ele, esse equívoco do governo fica claro ao se observar a queda da atividade industrial no fim de 2005:

¿ Não há dados disponíveis que atestem qualquer coisa em favor dessa visão otimista do governo ¿ diz Silveira, para quem os juros ¿ainda são estratosféricos¿. Mesmo após o corte na Selic, o pais ainda mantém a taxa real de juros em 12,1% ao ano, a maior do mundo.

Faltam `reformas e investimentos¿

O estrategista-chefe do BNP Paribas, Alexandre Lintz, diz que a visão otimista do governo ocorre pelo fato de a equipe econômica trabalhar com PIB potencial (capacidade de o país crescer, sem gerar inflação) muito elevado. Segundo Lintz, que projeta variação de 2,5% a 3%, para que o potencial de crescimento da economia estivesse no nível que o governo trabalha, o país precisaria ter avançado mais no estímulo ao investimento.

¿ O que gera crescimento potencial é investimento e isso continua baixo. Não existem reformas.

E o quadro, para os especialistas, não deve mudar muito em 2006:

¿ O PIB potencial do Brasil é medíocre e precisa ser mudado. Mas em ano de eleição, a paralisia toma conta do país ¿ afirma o diretor do Unibanco Asset Management, Alexandre Mathias.

O governo também acredita que a inflação fechará o ano em 3,8%, abaixo da meta de 4,5% prevista para 2006. Caso isso aconteça, será a primeira vez, desde a instituição do sistema de metas, em 1999, que isso vai acontecer. Este cenário também é mais otimista do que o vislumbrado pelos especialistas consultados. As projeções variam entre 4,3% e 5%, mas não geram preocupação.

¿ O quadro é bastante positivo em termos de inflação ¿ afirma Alexandre Lintz.

Os juros, segundo os analistas, devem fechar 2006 entre 15% e 15,5%. Para a relação dívida/PIB, a expectativa é de leve redução em relação ao percentual de 2005 ¿ de cerca de 51,5%. As estimativas variam entre 49,5% e 50,8% ao fim deste ano.

¿ A dívida pública e os juros são muito elevados. Por isso, a queda na relação dívida/PIB ocorre lentamente ¿ diz o economista do ABN Amro.

A equipe do Tesouro Nacional trabalha para melhorar o perfil da dívida, aumentando a participação de títulos prefixados no estoque de cerca 30% em 2005 para quase 40% este ano. Esses papéis são mais vantajosos para o governo, porque sua remuneração é acertada previamente, o que torna mais previsível, para o Tesouro, os valores na hora do resgate.

¿ Com os juros caindo, haverá procura por papéis prefixados. Além disso, a confiança na economia como um todo vem crescendo ¿ reconhece Roberto Padovani, da consultoria Tendências.

Juros nos EUA vão frear exportações

No cenário externo, os especialistas acreditam num quadro favorável, mas com leve desaceleração. Segundo Alexandre Lintz, isso deve ocorrer devido à alta de juros nos EUA. Ele calcula que a balança comercial brasileira deve fechar 2006 com exportações de US$127,3 bilhões, o que representa aumento de 7,6% em relação a 2005. Já o saldo esperado é de R$37,9 bilhões ¿ 15,4% menor que em 2005. Com o aquecimento do mercado interno, as importações devem crescer, reduzindo o saldo comercial.

¿ A economia mundial vai desacelerar em 2006, mas continuará bem. Cerca de 4% contra 4,3% no ano passado ¿ espera Mário Mesquita.

As expectativas dos especialistas para o superávit do comércio exterior variam de US$35,2 bilhões a US$41 bilhões. Já a projeção em relação ao câmbio é de valorização do dólar. As previsões para a cotação da moeda estão entre R$2,35 e R$2,50.

¿ Acreditamos que as importações ganhem fôlego este ano. Mas apostamos num superávit comercial de US$41 bilhões ¿ diz o economista Alexandre Antunes, da MCM.