Título: O repique
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/01/2006, O GLOBO, p. 2

Era previsível que as CPIs apertassem o cerco quando o Congresso voltasse a funcionar normalmente. Os sinais de recuperação do presidente Lula e sua movimentação de candidato não-declarado ajudaram a recarregar as baterias da oposição. Foi durante o recesso remunerado que Lula tomou fôlego. E assim a semana começa com o ministro Palocci na defensiva, antecipando-se a uma convocação pela CPI dos Bingos, e com Duda Mendonça ameaçando ligar o ventilador se tiver que voltar à CPI dos Correios.

Em relação às CPIs, PFL e PSDB já combinaram que a dos Correios deve marchar para a consolidação do que já apurou, mas que a dos Bingos deve ter seus trabalhos prolongados ao máximo. Ela é o palanque. Dali é que poderão sempre puxar novas e cabeludas denúncias capazes de deixar o PT e o governo tontos. O que não falta ali são fios desencapados: Palocci e seu passado de prefeito em Ribeirão Preto, o assassinato de Celso Daniel, a conexão Waldomiro/GTech/CEF, a empresa do filho do presidente e a atuação de seu irmão Vavá, bem como a de Paulo Okamotto (presidente do Sebrae que pagou suposto empréstimo do PT a Lula) e a do compadre Roberto Teixeira, acusado de ser o avô do caixa dois petista. Este último teve sua convocação aprovada na semana passada e Okamotto, o sigilo quebrado. Mas Palocci, pela posição que ocupa e a possibilidade de vir a ser o coordenador de campanha de Lula, é alvo mais valioso. Advertido pelo senador petista Tião Viana, membro da CPI, de que seria convocado, ele se apressou a negociar o comparecimento como convidado. Deve responder sobre os casos rocambolescas levantados por ex-auxiliares na prefeitura: os contratos com empresas que, segundo Rogério Buratti, pagavam tributo ao PT e o transporte, por Vladimir Poletto, de dólares que teriam sido doados por Cuba à campanha de Lula. Faltava ontem a chegada do presidente da CPI dos Bingos, Efraim Morais (PFL-PB), para ser acertada a data do comparecimento. Palocci sempre se saiu bem em suas explicações, mas desta vez não deve contar com qualquer indulgência da oposição. Vai ser um teste duro.

Já o retorno de Duda Mendonça à CPI dos Correios tem a ver com os indícios de que ele tenha outras contas no exterior, além da Dusseldorf, que disse ter aberto para receber os R$10,5 milhões que o PT lhe devia. Desde 1993 ¿ muito antes de o valerioduto ser inventado em 1998 ¿ ele teria movimentado, através de pessoas de confiança, mais de US$15 milhões no Bank of America. Seu advogado negou ontem a existência de outras contas e que ele esteja ameaçando fazer revelações sobre o financiamento de campanhas de diversos partidos. De todo modo, Duda sabe muito sobre muita gente. Nos últimos anos trabalhou não apenas para Maluf e depois para o PT. E num retorno à CPI, não mais será tratado como o bom menino que resolveu colaborar contando o que fez por exigência de Marcos Valério. Novas emoções vêm aí, nas CPIs.

Reforma política, agora é tarde

A crise estourou em junho, tirou as vestes do PT e mostrou as entranhas do financiamento das campanhas, mas até agora o Congresso não aprovou uma só medida destinada a evitar que as coisas se repitam. Os líderes começam a se mexer neste sentido.

O deputado Moreira Franco (PMDB-RJ) foi ontem indicado pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo, para relatar o projeto do senador Jorge Bornhausen (PFL-SC) que trata principalmente do barateamento das campanhas. Moreira recebeu sinais dos líderes de que gostariam que ele incluísse no relatório final alguns pontos da reforma política que não saiu. Mas agora é difícil. Quase tudo passou da hora, por conta do artigo 16, que proíbe mudanças eleitorais faltando menos de um ano para o pleito. O que ainda pode ser feito será discutido hoje pelos líderes na reunião com Aldo Rebelo. Também hoje os que defendem o fim das verticalização (todos, menos PT e PSDB) decidem se enfrentam ou não a votação da emenda amanhã.