Título: Mudar a regra, prós e contras
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 25/01/2006, O GLOBO, p. 2

São grandes as chances de a Câmara aprovar hoje a emenda que acaba com a verticalização das coligações, medida que pode alterar profundamente os jogos sucessórios em curso. O presidente Lula finalmente se mexeu a favor da emenda e até o discreto senador Marco Maciel rompeu o silêncio para fazer pregação. São sinais de que as condições mudaram. Mas, derrubada a regra, virão complicações jurídicas que também podem embolar as definições partidárias.

Lula estaria trabalhando dentro do PT, que se definiu pela manutenção da regra, para garantir alguns votos a favor de sua derrubada. Mas na reunião com líderes aliados, segundo o senador Fernando Bezerra (PTB, líder no Congresso), disse apenas que, embora sendo contra, não iria interferir. Cada partido que fizesse sua avaliação. ¿Não quero o apoio de ninguém à força¿, teria dito. Seja como for, os defensores da emenda (todos, menos o PT e o PSDB) acreditam que terão uns 50 votos de tucanos e petistas. Estimavam ontem ter 325 votos, quando são necessários 308.

Marco Maciel é um dos maiores especialistas em legislação eleitoral no Congresso. Silencioso ao longo da crise, ontem ele conversou muito e com muitos sobre a verticalização. Diz em resumo que só o voto vinculado, imposto pelos militares em 1982, tem natureza tão autoritária quanto a verticalização: as duas medidas não apenas ferem a liberdade dos partidos para se coligar como restringem as opções do eleitor. Se o partido A, por apoiar o candidato B a presidente, está impedido de se coligar com o C para governador, a vontade do eleitor que gostaria de votar nas coligações A-B e B-C também é atingida. Quanto ao fato de o artigo 17 (era 16 no texto original da Constituição, mas com tantas emendas, a numeração foi alterada) proibir mudança nas regras eleitorais faltando menos de um ano para o pleito, sustenta que uma emenda constitucional sobrepõe-se a qualquer artigo. Valeria o argumento se se tratasse de lei ordinária. Diz ainda que por tal raciocínio, ao baixar a regra por instrução normativa em 1982, o TSE também violou o artigo 17.

São bons argumentos, sem dúvida, aos quais deve-se acrescentar o fato de que num país com partidos de tão forte viés regional, a exigência de coligações verticais (com os mesmos partidos, tanto para presidente como para governador) chega a ser quase uma violência.

Mas há quem diga, também com razão, que o artigo 17 foi incluído na Constituição exatamente para evitar mudanças intempestivas das regras eleitorais, os tais casuísmos de que tanto se valia a ditadura para se perpetuar. A votação de hoje pode abrir um precedente perigoso.

Por fim, recursos ao STF, como o que promete o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), podem jogar o processo eleitoral na incerteza jurídica até que o tribunal dê a palavra final.