Título: Cresceu, mas não dobrou
Autor: Luiza Damé, Regina Alvarez e Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 25/01/2006, O País, p. 3

Acordo garante maior aumento do governo Lula e reajuste de 8% para a tabela do IR

De olho no eleitorado mais pobre, mas também na classe média, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fechou acordo com as centrais sindicais para conceder o maior reajuste do salário-mínimo de seu mandato, além de antecipar o aumento para 1º de abril e conceder a correção na tabela do Imposto de Renda. Pelo acordo, que depende do aval do Congresso, o mínimo passará de R$300 para R$350, e a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física será corrigida em 8% a partir de fevereiro. As medidas beneficiam cerca de 47 milhões de pessoas, considerando 40 milhões de trabalhadores e beneficiários da Previdência que recebem até um salário-mínimo e mais sete milhões que atualmente pagam IR.

Na reunião, Lula bateu o martelo sobre a proposta das centrais, preterindo a que previa o aumento do mínimo a partir de março, com correção maior da tabela do IR em 10%.

¿ A LDO previa um mínimo de R$217, e o Orçamento, de R$321, mas era pouco. Temos de demarcar um campo novo nesta discussão. Sei da repercussão desse aumento para R$350 nas prefeituras, mas tenho um compromisso com a camada mais pobre e decidi bancar um aumento maior ¿ disse Lula na reunião.

O aumento real do mínimo, segundo o Ministério do Trabalho, será de 13%, o maior concedido desde 1985. Mas Lula chegará ao final de seu mandato sem cumprir a promessa de campanha de dobrar o valor do mínimo. Depois de quase dois meses de negociação, Lula aceitou a proposta das centrais, que também cederam na reivindicação inicial. Até a semana passada, o governo afirmava que não poderia antecipar o aumento nem corrigir a tabela acima de 7%. Governo e sindicalistas comemoraram o acordo.

¿ Lógico que não é uma maravilha. Não é o dobro, como prometeu Lula, mas saio satisfeito. É uma vitória das negociações, das centrais e do governo, mas principalmente de quem ganha salário-mínimo ¿ disse o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva.

¿ Este é um momento histórico. Nunca houve um acordo entre todas as centrais e o governo ¿ disse a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Ministro compara ganhos com era FH

Depois da reunião, Dilma anunciou oficialmente a decisão de Lula, ao lado dos ministros do Trabalho, Luiz Marinho, e do Planejamento, Paulo Bernardo. Marinho fez uma apresentação dos ganhos do mínimo no governo Lula, comparando-os com números dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso. O ministro disse que, com Lula, o mínimo praticamente duplicou, se considerar a relação com o custo da cesta básica e de outros itens, como feijão, carne e cimento.

¿ Quase dobramos o poder de compra do mínimo ¿ disse Marinho.

O relator do Orçamento, deputado Carlito Merss (PT-SC), admitiu que a decisão trará ganhos eleitorais:

¿ É lógico! O povo não é bobo! Por isso a oposição está tão agressiva. Não quer que o governo governe.

O impacto do reajuste do mínimo e da correção da tabela do IR no Orçamento da União de 2006 será de R$6,6 bilhões ¿ R$5,6 bilhões referem-se ao mínimo e R$1 bilhão é a estimativa de renúncia fiscal com o ajuste da tabela, cuja correção depende de medida provisória que será enviada ao Congresso em fevereiro, segundo Marinho. A mudança valerá para os descontos na fonte a partir da edição da MP, mas, para efeitos do ajuste anual, só na declaração de 2007.

O mínimo teve aumento nominal de 16,6%. No Congresso, o governo enfrentará a oposição, que defende R$400. Segundo Dilma, o aumento representará um incremento de R$2,6 bilhões na arrecadação de impostos.

¿ Fomos buscar um valor que desse conforto para as centrais sindicais e levasse em conta a estabilidade do gasto público. Ele não é uma aventura, é algo efetivo ¿ disse a ministra.

Ontem o dia foi de negociações. Primeiro Merss se encontrou com os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, do Planejamento, Paulo Bernardo, e Dilma. À tarde, Lula recebeu líderes aliados da Câmara e do Senado para anunciar a decisão. Paralelamente, o ministro do Trabalho conversava com sindicalistas. No fim da tarde, Lula recebeu os representantes das centrais e anunciou a decisão. O valor de R$350 dividiu opiniões no Congresso.

¿ É o maior valor em 20 anos ¿ exaltou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

A oposição foi crítica:

¿ Lula fica longe de cumprir a promessa absurda que fez como candidato, de dobrar o valor do mínimo. Defendo o maior aumento possível que não quebre as pequenas prefeituras e nem as contas da previdência ¿ disse o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), acrescentando que o reajuste da tabela do IR é eleitoreiro.

O líder do PFL, senador Agripino Maia (RN) prometeu discutir o valor com a bancada, antes de definir se o partido irá ou não apresentar contraproposta elevando o reajuste:

¿ Se é só isso que o governo pode dar, não deveria ter feito aquela promessa ¿ ressaltou Agripino.