Título: ILUSÕES FISCAIS
Autor:
Fonte: O Globo, 25/01/2006, Opinião, p. 6

Nas últimas semanas, líderes sindicais e ministros, entre eles Luiz Marinho, do Trabalho, também dirigente sindical, consumiram horas em reuniões sobre o novo salário mínimo. Como sempre acontece, os representantes dos trabalhadores pediram alto para conseguir o máximo. E levaram mais um reajuste real, acima da inflação, substantivo: os R$350,00 definidos para entrar em vigor em abril estão 16,6% acima do mínimo em vigor, ou mais de 10% que a inflação anualizada. Não se tem notícia de aumento de produtividade nessa proporção.

O reajuste do salário mínimo não é mesmo desprezível, considerando-se, ainda, os aumentos anteriores, também acima da inflação. É indisfarçável a influência do calendário eleitoral na decisão anunciada ontem. E de tudo isso resta a falsa idéia de que a questão do salário de base depende de acordos políticos e da maior ou menor vontade dos governantes. Tudo ilusório. Se fosse assim, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria cumprido a promessa de campanha, feita em 2002, de dobrar o poder de compra do mínimo. Para isso, em vez de R$350,00, ele deveria ter batido o martelo em torno de uma cifra acima dos R$450,00.

Fácil seria se não existisse o impacto fiscal do reajuste. Por ser o salário mínimo indexador de 64% dos benefícios pagos pelo INSS, quando ele aumenta, sobem também os gastos de um sistema previdenciário estruturalmente deficitário.

Os generosos reajustes do passado já ajudaram bastante a catapultar o déficit do INSS. De 2004 para 2005, o rombo deu um salto de 11,3%, de R$34,3 bilhões para R$38,2 bilhões, valor equivalente a 2% do PIB. O problema é mais grave que os juros da dívida.

Estes pesam mais no PIB; porém, estão em queda, enquanto o rombo da Previdência, por ter causas estruturais, só tende a subir. O salário mínimo de R$350,00 fará o déficit previdenciário mudar de patamar. Sem contar o peso a mais sobre estados e municípios.

Até hoje o governo tem-se beneficiado de aumentos na arrecadação, pela ampliação da carga tributária, ou pelo crescimento da economia. Tem podido, assim, continuar a aumentar perigosamente os gastos correntes não financeiros. Até quando?