Título: CASAMENTO ABERTO
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 26/01/2006, O País, p. 3

Câmara derruba regra da verticalização e dá liberdade total para coligações partidárias

Com o empenho pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e a virada de quase duas dezenas de petistas, a Câmara dos Deputados derrubou ontem a verticalização, regra que subordina as alianças regionais à coligação federal. Com isso, a oito meses do pleito, foi liberado o vale-tudo nas eleições presidenciais deste ano. Os partidos terão ampla liberdade para fazer coligações, inclusive se aliando nos estados com legendas que serão adversárias na disputa para a Presidência da República.

A aprovação da emenda constitucional que acaba com a verticalização, processo liderado pelas bancadas do PFL e do PMDB, foi obtida com o voto de 343 deputados ¿ 35 votos a mais do que os 308 necessários para mudar a Constituição. Quatorze deputados do PT, entre eles o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP), votaram pelo fim da norma, desobedecendo posição da bancada e da Executiva do partido. Os defensores da manutenção da verticalização conseguiram apenas 143 votos.

¿ Eu voto com o presidente Lula ¿ disse o vice-líder do PT, Luiz Eduardo Greenhalgh (SP), enquanto digitava sua senha para votar.

Dia foi de incerteza nas bancadas

Apenas o PT e o PP encaminharam o voto não à emenda. O PSDB, mesmo sendo contra, teve que liberar a bancada por pressão dos governadores Aécio Neves (MG) e Simão Jatene (PA). A emenda terá de ser votada em segundo turno antes de ir à promulgação, mas pela diferença de votos não há risco de mudança no resultado. O placar, muito comemorado no plenário, viabiliza a realização das prévias do PMDB e o lançamento de um candidato do partido à Presidência. Mas o fim da verticalização ainda terá de ser chancelado pelo Judiciário, pois o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), vai recorrer da decisão do STF.

¿ Nós sabíamos que se todos os partidos garantissem os votos nós venceríamos a votação ¿ disse o líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ).

A votação foi rápida, sem nenhuma tentativa de obstrução. Miro Teixeira criticou o texto da emenda, pois previa sua vigência para as eleições de 2002, e disse que a mudança que seria aprovada feria o direito do cidadão de conhecer com antecedência as regras eleitorais e o princípio da segurança jurídica. Ele foi contestado pelo presidente do PMDB, Michel Temer (SP), e pelo vice-presidente da Câmara, Thomaz Nonô (PFL-AL), que lembrou que o TSE alterou a interpretação da lei a seis meses do pleito de 2002.

¿ As leis devem nascer deste plenário. Toda lei que nasce em outro lugar é torta ¿ disse Nonô.

Com a divisão da base e da oposição, o dia foi marcado pela incerteza quanto ao resultado da votação. Mesmo sem saber se venceriam, os defensores da aprovação da emenda decidiram que ela teria de ser votada na sessão de ontem, pois na semana que vem as medidas provisórias voltam a trancar a pauta do plenário.

Sarney e Roseana pediram votos

Logo cedo, reunidos na casa do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), os líderes também concluíram que a cada dia que passava maior as dificuldades para aprová-la.

Os líderes do PFL, Rodrigo Maia, do PMDB, Wilson Santiago (PB), do PSB, Renato Casagrande (ES), do PCdoB, Renildo Calheiros (PE), e mais de uma dezena de parlamentares fizeram um levantamento e concluíram ter os 318 votos para aprovar a emenda. Nesta altura, eles já contavam as perdas no PFL provocadas pela decisão do senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que tem 18 votos na bancada de 63 deputados, de votar pela manutenção da verticalização. Antonio Carlos foi um dos alvos dos senadores José Sarney (PMDB-AP) e Roseana Sarney (PFL-MA), que entraram de corpo e alma na articulação para aprovar a emenda. Roseana foi para dentro do plenário da Câmara fazer corpo a corpo.

Apesar de a bancada do PT ter reafirmado sua posição favorável à verticalização, Greenhalgh participou da reunião, em que se decidiu trabalhar para obter entre dez e 15 votos dos 90 deputados petistas.

¿ Nós temos os votos no papel, mas decidimos marcar a votação para a noite para que esses votos apareçam no painel eletrônico ¿ disse Renildo Calheiros.

Mesmo assim, os boatos pela manhã eram de que a emenda não seria submetida a voto. O resultado da reunião do PP, que decidiu votar contra a emenda, aumentou as dúvidas sobre a votação. O líder, em exercício do PP, deputado Mário Negromonte (BA), anunciou que o partido defenderia a manutenção da verticalização, mas reconheceu que dos 52 deputados um número entre 10 a 12 votariam a favor da emenda.

¿ Vamos votar com a emenda porque isso convém ao partido nos estados ¿ disse Érico Ribeiro (PP-RS).

O PSDB também se reuniu e manteve sua posição de liberar a bancada de 52 deputados, da qual se estimava que 21 votariam a favor da emenda. No final da manhã, o deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO) tinha refeito as contas e contabilizava apenas 312 votos a favor da emenda. A situação melhorou no início da tarde com a notícia de que alguns deputados do PT estavam dispostos a atender ao apelo feito pelo presidente Lula, e apesar da posição da bancada, votar a favor da emenda.