Título: CHINA CRESCERÁ MENOS PARA EQUILIBRAR O SOCIAL
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 26/01/2006, Economia, p. 23

Em Davos, governo chinês diz que meta será alta de 8% do PIB para combater desigualdade. Índia avançará 10%

DAVOS (Suíça). Enquanto o Brasil luta, sem sucesso, para crescer no ritmo dos asiáticos, a China ¿ que acaba de anunciar expansão de 9,9% da sua economia em 2005 ¿ quer crescer menos. Cheng Siwei, vice-presidente do Parlamento chinês e um respeitado economista no país, anunciou que o governo chinês tem como meta baixar o crescimento para 8%, durante um debate na reunião anual do Fórum Econômico. Segundo ele, o plano de metas que a China vai anunciar em março, para os próximos cinco anos, terá menos ênfase no crescimento econômico e mais no combate a um problema que o Brasil conhece bem: a desigualdade social.

¿ Nós podemos manter uma taxa de crescimento relativamente alta, mas não tão alta quanto taxas de dois dígitos. Nós queremos baixar a taxa para 8% e dedicar mais energia no progresso social ¿ disse Cheng.

`Asiáticos são complacentes com os déficits dos EUA¿

A China tem como desafio garantir emprego aos 300 milhões de camponeses que migraram para as cidades, ao ritmo de 20 milhões por ano. O crescimento extraordinário nos últimos anos (em torno de 10%) tem ajudado. Mas a disparidade entre a riqueza das cidades e do campo está causando protestos sociais. A pobreza rural é tema de debate hoje em Davos. Zhu Min, presidente-executivo assistente do Banco da China, disse que a economia pode desacelerar um pouco em 2006 devido ao excesso de capacidade nas indústrias de aço, alumínio e manufaturados. Mas o país ainda crescerá de 8,8% a 9,3%.

No entanto, Stephen Roach, economista-chefe do Morgan Stanley, fez um alerta para o que considera ¿excesso de complacência de mercados e autoridades¿ quanto aos desequilíbrios da economia mundial. Segundo ele, os bancos centrais asiáticos têm permitido que esse desequilíbrio persista ao sustentar os déficits da economia americana por mais tempo que o devido, o que pode representar uma grande ameaça no futuro.

Alerta para riscos mundiais: petróleo, gripe e terrorismo

China e Índia, como esperado, atraíram todas as atenções do Fórum Econômico de Davos, que abriu oficialmente ontem, com mais de 2.300 participantes, entre eles 700 líderes empresariais. Empresários e políticos disputavam para entrar nas salas de conferência e ouvir Cheng anunciar que a China vai continuar buscando oportunidades internacionais de investimentos no setor energético, nos moldes do acordo com a Índia. Ou ainda empresários como Ta-Lin Hsu, presidente do H&Q Asia Pacific ¿ administradora de fundos de capital de risco ¿ prevendo que empresas chinesas continuarão comprando grandes marcas mundiais, como tentou fazer em 2005 com a petroleira americana Unocal.

E como o crescimento chinês ¿ o mais rápido do mundo ¿ mexe com economias do mundo inteiro, todos tinham algo a falar. O secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Adams, disse que a China tem de valorizar mais a sua moeda. Para ele, a alta de 2,1% do yuan em relação ao dólar ainda não foi suficiente. A preocupação dos EUA é que o yuan baixo prejudica as exportações americanas.

No rastro dos chineses, vem a Índia, outra estrela de Davos. Executivos de grandes empresas indianas, como Rahul Bajaj, presidente da Bajaj Auto, estão prevendo que a Índia vai atingir crescimento de 10% dentro de três anos. A Índia deve crescer entre 7,5% e 8% em 2006. Há expectativa de que grandes empresas indianas, como a Infosys (software) ou a Ranbaxy (farmacêutica) partam para a compra de empresas de outros países, num esforço para se internacionalizarem.

E o Brasil, por que não cresce tanto quanto Índia ou China? O país não foi mencionado. Alguns, estimulados por perguntas de jornalistas brasileiros, falaram.

¿ Por quê? Sucesso econômico requer muito mais tempo do que os políticos querem dar. Com políticas certas, vocês, definitivamente, irão na direção certa ¿ disse Jacob Frenkel, vice-presidente da AIG.

Roach, do Morgan Stanley, falou, relutante:

¿ Brasil? Adoro o Brasil, mas tenho que ir... Bom, o Brasil precisa fazer mais microrreformas, reestruturação de empresas, em particular. O Brasil está ficando dependente do crescimento chinês, e se a China desacelerar será um problema.

Pesquisa do Fórum Econômico identificou quatro riscos para a economia global nos próximos dez anos: choque do petróleo, se o barril atingir US$80; mutação do vírus da gripe de aves capaz de causar epidemia humana; terrorismo e mudança climática.

FÓRUM SOCIAL PODE BUSCAR APROXIMAÇÃO COM GOVERNOS, na página 24