Título: Em 2004, orçamento não deve ser cumprido
Autor: Erica Ribeiro
Fonte: O Globo, 19/11/2004, Economia, p. 31

Nos últimos dois anos, a lentidão na liberação de financiamentos do BNDES foi alvo de críticas de diferentes setores. Pela primeira vez na história, o banco não deverá cumprir o seu orçamento. O próprio Carlos Lessa chegou a admitir que isso aconteceria. Até outubro deste ano, o banco só liberou apenas 63% de seu orçamento. O desempenho é considerado ruim por analistas e empresários, que reclamavam da falta de diálogo com a instituição.

O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletrônicos (Eletros), Paulo Saab, não lamentou a saída de Lessa. Segundo ele, por dois anos o setor tentou um contato com a instituição e não conseguiu ir além de encontros com áreas técnicas.

Para analistas, o BNDES não cumpriu o orçamento porque se concentrou em projetos para grandes empresas quando deveria dar prioridade aos pequenos negócios. Também consideraram a morosidade entre as fases de consulta (interesse da empresa por empréstimo) até o desembolso um entrave na liberação de recursos.

¿ Grandes empresas não precisam do BNDES. Para elas existem bancos privados. Na gestão de Lessa o banco se comportou como empresário, preocupado apenas com participações acionárias ¿ disse um analista.

Os desembolsos para micro e pequenas empresas foram de R$ 10,1 bilhões de janeiro a outubro deste ano. O resultado é considerado insignificante para outro analista.

¿ As pequenas empresas não têm acesso a crédito no Brasil. O banco deveria ser o financiador do setor para aumentar a geração de emprego e renda e fazer sem burocracia e com menos lentidão.

O sócio de uma média empresa fluminense do setor metal-mecânico conta que o BNDES demorou quatro meses para aprovar um pedido de financiamento. Da elaboração do projeto à avaliação pelo agente financeiro, mais de seis meses até o empréstimo sair. Os planos para duplicar a produção foram adiados.

Para o economista Antônio Porto Gonçalves, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), problemas internos ajudaram a emperrar os desembolsos.

¿ O comportamento interno do banco e do próprio Lessa, que não soube administrar suas divergências com o governo, ajudaram. Mas a situação econômica do país inibiu o empresário e isso contribuiu ¿ afirma Gonçalves.

Ainda segundo o professor da FGV, Lessa não foi paciente e não soube transitar entre as alas desenvolvimentista e monetarista do governo Lula:

¿ Acho que ele (Lessa) falou demais. Mas não acredito que a entrada de Mantega vá tornar o BNDES monetarista. Sua postura mais flexível vai ajudá-lo ¿ disse.