Título: Ermínia Maricato: `Nunca houve política pública de moradias para pobres¿
Autor: Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 23/11/2004, O País, p. 3

Coube à professora e urbanista Ermínia Maricato chefiar a elaboração do principal plano de ação do Ministério das Cidades. Secretária-executiva da pasta, Ermínia Maricato afirma que o país vive uma imensa crise urbana em conseqüência da falta de políticas nas últimas décadas para as áreas de habitação, saneamento e transporte. Ela defende um pacto federativo, envolvendo municípios, estados e União, para o país solucionar todos esses problemas. Segundo ela, o Brasil nunca teve uma política séria de habitação para os mais pobres, e a exclusão social potencializou os problemas urbanos do país, inclusive a violência. Ermínia defende a expansão imediata dos investimentos no setor.

Que diagnóstico faz o documento que cria a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano?

ERMÍNIA MARICATO: Revela que o país vive uma imensa crise urbana, causada pela falta de investimento e prioridade nesse setor. Nunca houve política pública de moradia para pobre, nem no BNH. Há mais de vinte anos o governo não atua no planejamento urbano. Os números sobre déficit habitacional, saneamento e transporte urbano revelam o descuido ao longo desses anos.

O que gerou todo esse déficit urbano?

ERMÍNIA: A pobreza brasileira se urbanizou, seguindo um fenômeno mundial. Metade da população mundial ainda é rural, mas é exatamente nos países mais pobres que o processo de urbanização mais cresce. A histórica exclusão social nas cidades criou mazelas e mostrou a face da pobreza, da ilegalidade e da violência.

Mas as cidades brasileiras não se estruturaram?

ERMÍNIA: O modelo de crescimento das nossas cidades reproduz a cultura herdada do período autoritário. É um modelo excludente, que desconsidera as necessidade da maioria dos moradores dela excluídos. É um modelo baseado na expansão horizontal, na subutilização das infra-estruturas e urbanidade já instalada e no deslocamento por automóvel.

Qual a solução para esses problemas?

ERMÍNIA: Estamos apresentando a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, que estabelece metas, diretrizes e ações. Mas é fundamental um pacto federativo, com a participação dos municípios e dos estados. O governo federal não dá conta de tudo. As cidades têm um papel central. Agora, vamos colocar os problemas urbanos na agenda nacional.

Por que esse programa não foi lançado antes, no início do governo?

ERMÍNIA: Porque era fundamental esse tempo para se fazer um diagnóstico preciso e programar políticas e prever metas e diretrizes corretas. Mas não ficamos parados esse tempo. Fizemos muita coisa.

O que o governo fez até agora nessa área?

ERMÍNIA: Ampliamos as políticas e os recursos. Na área de habitação, em 2003, o orçamento do governo federal para o setor ultrapassou os R$ 5 bilhões, valor 25% superior ao de 2002.

Mas esses recursos são suficientes?

ERMÍNIA: Apesar do aumento significativo, principalmente se comparado com anos anteriores, o ministério considera urgente a expansão dos investimentos públicos em habitação e infra-estrutura nos três níveis de governo.