Título: Ranger de dentes
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/11/2004, O Páis, p. 2

Começa agora o presidente Lula a enfrentar as reações do PT à redução de sua hegemonia no governo, que virá com a ampliação do espaço dos aliados. Os petistas reagem à permanência do ministro Aldo Rebelo (PCdoB) na Coordenação Política e ensaiaram pressões sobre a política econômica, que foram prontamente repelidas pelo presidente Lula na noite de segunda-feira.

A política é esta mesma, está dando resultados, temos que persistir e melhorar a eficiência do governo, foi mais ou menos o que disse Lula. Já a disputa pela Coordenação Política é surda, porém, intensa. Não se trata exatamente de um cargo, mas da disputa pela orientação política do governo daqui para a frente Na sexta-feira, Lula teve uma conversa com Dirceu, conforme já registrado aqui, informando-o de que não pretende mexer na estrutura palaciana. Ou seja, Aldo na Coordenação Política e ele na Casa Civil, dedicado exclusivamente ao gerenciamento administrativo. Dirceu não gostou, não contestou e tem dito com ênfase que está fora da articulação política por desejo do presidente. Mais do que ele, o PT é que não se conforma com a presença de Aldo na atual posição, sobretudo depois da ampliação do governo.

Na reunião do diretório nacional do PT, no fim de semana, o ministro Tarso Genro expressou muito claramente os dois objetivos que agora devem perseguir: a reconquista da Coordenação Política e a exigência de concessões à equipe econômica, que permitam a produção de resultados, pelo governo, no ano crucial de 2005.

São reações à decisão de Lula de fazer agora um governo de coalizão, tese que sempre teve em Aldo um defensor. Mas foi a realidade política pós-eleitoral que impôs esta opção, também defendida pelo líder Mercadante e pelo presidente do partido, Genoino. Ontem mesmo uma rebelião da oposição, ameaçando obstruir todas as votações, confirmou o acerto da decisão de Lula, de ampliar o governo para garantir a governabilidade.

Até aqui, a orientação política do governo foi dada por Dirceu, tendo como principais aliados João Paulo e José Sarney. Eles acabam de perder também a disputa pela aprovação da emenda da reeleição das Mesas, que daria mais um mandato aos dois últimos. É provável que Lula vá administrando as pressões por mudança no comando político até fevereiro, quando haverá a eleição dos novos dirigentes do Congresso. Então, dependendo do que acontecer, poderá ou não fazer mudanças.

Na reunião de segunda-feira à noite com ministros e executivos do PT, o governo não deu espaço para as críticas à política econômica. Ouviu impertinências mas disse duras verdades. As pressões, entretanto, continuam, agora dirigidas para a escolha do nome que ocupará o Ministério do Planejamento. Exige o PT que seja alguém com nítido perfil desenvolvimentista, capaz de funcionar como contraponto à Fazenda. Ninguém melhor que Ciro Gomes, dizem eles. Mas o próprio Ciro, que não teria sido ouvido nem sondado, vem dizendo a amigos que esta seria uma má solução. Por tudo que ele pensa e diz da política econômica (não na rua mas dentro do governo), sua escolha seria um sinal de ambigüidade muito ruim. Este é um problema mais imediato, já estando decidido que o PMDB terá um ministério mais musculoso (possivelmente Cidades) e o PP terá uma pasta (possivelmente Esportes).