Título: ESTÁ NA HORA DE UMA REAÇÃO NA ALERJ
Autor: Alessandro Molon
Fonte: O Globo, 25/11/2004, Primeiro Caderno, p. 7

O Rio de Janeiro vive uma grave crise institucional, talvez nunca antes vivida. Saímos há pouco de um tumultuadíssimo processo eleitoral, em que a governadora Rosinha e seu marido, Garotinho, conseguiram ocupar as páginas dos jornais com os piores exemplos de tentativas de manipulação das eleições. Cadastramento para comprar casas a um real, distribuição de cheques-cidadão e de cestas básicas sem qualquer critério, entrega de kits escolares a um mês do fim do ano letivo, apreensão de mais de R$300 mil sendo "doados" às vésperas do pleito na sede do PMDB em Campos. Isto sem falar na inacreditável transferência da sede do governo do estado para Campos, a 15 dias da eleição. Atitudes aviltantes e ofensivas à população do estado, motivo de vergonha diante de todo o país.

Se no Poder Executivo estadual as coisas vão de mal a pior, no Poder Legislativo, infelizmente, também não vão nada bem. Além de dar sustentação política a este (des)governo que decide nossos destinos, a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) vê-se agora enlameada por graves denúncias. A cada semana novas denúncias e novos suspeitos. Gravações feitas por intermediários de Carlos Cachoeira, um dos acusados pela CPI da Loterj, mostram deputados tentando achacá-lo para que seu nome fosse retirado do relatório final da comissão.

Segundo as gravações, cobravam-se em tese R$4 milhões, para que se comprasse o voto de 40 dos 70 deputados, a R$100 mil cada um. Uma denúncia gravíssima, já que, a se comprovar isto, deputados estariam usando seus mandatos para cometer crimes.

Diante destas explosivas reportagens, o que fez a Alerj? Cometeu diversos equívocos. Em primeiro lugar, adiantou em uma semana a votação do relatório da malfadada CPI. Ora, não deveria fazer justamente o contrário? Isto é, apurar as denúncias de extorsão para depois votar o relatório livre de suspeitas. Mas isto não foi feito. Tal pressa fez parecer que a Alerj desejava colocar uma pedra sobre o assunto. Recusei-me a participar da votação. O relatório foi aprovado e, como previsto, esta atitude levantou ainda mais suspeitas sobre os procedimentos da casa e a lisura dos deputados.

Além deste, outro erro importante foi cometido pela Alerj. Na semana seguinte à aprovação do relatório, foram publicadas novas conversas, nas quais supostamente aparece o presidente da CPI da Loterj tratando do dinheiro da extorsão. Que atitude deveria a casa tomar diante de tais fatos? Aprovar a criação do Conselho de Ética e de Decoro Parlamentar, à semelhança da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e das mais importantes assembléias legislativas do país. Defendi que a mesa diretora da Alerj colocasse imediatamente em votação um projeto que prevê tal conselho e que há um ano e dois meses encontra-se absolutamente parado na casa.

Em vez de aceitar tal sugestão, a mesa diretora adotou uma solução insatisfatória. Criou uma comissão especial, composta por três deputados, para ajudar a Corregedoria da Alerj a investigar as denúncias. Em vez de um conselho de ética com composição permanente e proporcional às bancadas representadas na casa, uma comissão criada somente para este caso. Lamentavelmente falta vontade política na Alerj para se criar um conselho de ética, com regras previamente definidas e procedimentos claros, a ser acionado em eventuais denúncias envolvendo parlamentares.

Como se vê, o Poder Executivo e o Poder Legislativo de nosso estado não estão dando passos na direção do aprimoramento da democracia. Nossas instituições não estão se aperfeiçoando, se tornando mais transparentes e vigorosas. Estão caminhando na contramão do que deseja a população.

O governo do estado já recebeu suas primeiras respostas nas urnas. Levou uma surra. Se a Alerj não refletir sobre seus erros e não corrigir seus rumos, certamente se assustará com a voz das urnas em 2006. Isto se a sociedade não reagir antes, mobilizando-se para exigir mudanças imediatas na casa que deveria representar a sua vontade.

Lamentavelmente falta vontade política na Alerj para se criar um Conselho de Ética