Título: Batata no forno
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 01/12/2004, Panorama Político, p. 2

Os dias estão passando e o governo Lula não conseguiu até agora uma solução para seu mais importante problema político ¿ o risco de ver a convenção do PMDB acontecer no dia 12 e aprovar a saída do partido da base governista. Apesar do encontro do presidente Lula com deputados e senadores do partido, nada de objetivo foi feito para evitar a convenção.

E se ela acontecer, reconhecem os próprios aliados do governo, é grande a possibilidade de uma vitória do grupo que defende o rompimento. Em suas conversas nas últimas horas, o senador José Sarney lamentou que o governo tenha deixado suas relações com o PMDB se deteriorarem tanto. Tratou do assunto à tarde com o ministro Aldo Rebelo. Os ministros peemedebistas Amir Lando (Previdência) e Eunício Oliveira (Comunicações) estiveram no Congresso discutindo com seus liderados uma estratégia para evitar a convenção. Voltaram como chegaram, sem solução. Lamentaram também a pouca ação do Planalto. Lula prometeu um governo de coalizão, acenou com mais um ministério, mas nada de objetivo foi feito. Mas enquanto isso os adversários trabalham. O governador Luiz Henrique, que defende o apoio a Lula apesar do PT catarinense, que decidiu fazer-lhe oposição, foi assediado pelo presidente do partido, Michel Temer, num demorado almoço. Os convencionais continuam sendo convocados para a convenção e recebem, no mesmo envelope, uma carta do ex-governador Orestes Quércia, pregando a ruptura com o governo.

Os aliados cobram um gesto de Lula que, por sua vez, pode ter perdido a hora. Para oferecer uma pasta ao PMDB, teria que fazer isso até hoje, no máximo. Assim o aliado ¿grupo da governabilidade¿ teria tempo para convencer os hesitantes a desmarcar a convenção. Mas Lula teria pesado o risco de, mesmo fazendo sua oferta, a convenção acontecer e aprovar a ruptura. Como dizem os jovens, seria um mico.

Solução definitiva não há, pois a ambigüidade é da natureza do PMDB. Continuará rachado de todo modo, como dizia ontem o ministro Eunício:

¿ Convenção para quê? Já sabemos o que uns e outros pensam. Só para nos estraçalharmos em praça pública?

A estratégia do governo, nesta altura, é esperar o racha. Com ou sem convenção, a ala governista ficará com Lula. E, passado o transe, deve tratar de substituir Michel Temer na presidência do partido. Por não ter feito isso no ano passado, quando foi aprovado o ingresso no governo, viu agora Michel capitanear o levante pela ruptura.

Pondo pedras

O PFL está disposto a dificultar o quanto puder o ingresso da senadora Roseana Sarney no ministério de Lula. Se for convidada (ela jura que não foi) e pedir licença do partido, não será atendida. Teria que se desfiliar, o que lhe seria muito difícil, por conta das desavenças na política maranhense. Mas ela continua nos planos de Lula.

O que deu muita alegria aos pefelistas foi o auto-lançamento da candidatura do prefeito Cesar Maia a presidente em 2006. Mas ele parece ter se surpreendido com a reação negativa dos cariocas. Hoje tomará o café da manhã com Roseana, que achou precipitado seu movimento. Ontem seus secretários começaram a resolver pendências da Prefeitura do Rio com o ministro Dirceu.

FH e os tomates

O ex-presidente Fernando Henrique teve um dia como aprecia ontem: falou-se dele o dia todo no Congresso. Os governistas rebatendo, tucanos e pefelistas endossando suas críticas ao governo Lula, que chamou de incompetente. Teve a infelicidade temporal de subir o tom de suas críticas ao sucessor na véspera da divulgação do crescimento do PIB no terceiro trimestre, que já garante um crescimento de 5% à economia brasileira este ano, o maior desde 1995. O presidente do PT, José Genoino, revidou com a memória:

¿ Ele pisou no tomate de novo. Todos se lembram de que, em 1986, o senador Fernando Henrique fez um duro ataque ao governo Sarney na véspera da decretação do Plano Cruzado, recebido com júbilo pela população brasileira. Pegou muito mal.

Na época, o então ministro Fernando Lyra também criticara Sarney e tratou de minimizar sua gafe:

¿ Eu pisei no tomate, mas o Fernando Henrique pisou no tomateiro todo.

Sarney teria dado boas risadas ao telefone com a lembrança de Genoino.

.

O PORTA-VOZ do Itamaraty, ministro Ricardo Neiva Tavares (e não Neiva Moreira, como saiu grafado por engano ontem), aponta outras bobagens ditas na passagem de chefes de Estado estrangeiros pelo Brasil em novembro. Uma delas, a de que foi tolice conceder ao Vietnã o status de Nação Mais Favorecida (NMF): ¿Este é um tratamento de mão dupla, usado para incrementar as relações com países não filiados à OMC através de redução de barreiras tarifárias. O Vietnã é o país que mais cresce na Ásia depois da China¿, diz ele.

O BLOQUINHO de esquerda formado por PDT, PPS, PCdoB e PSB convidou alguns economistas para um seminário hoje. Todos críticos da política econômica, como Darc Costa, ex-BNDES. Gonzaga Beluzzo havia confirmado, mas alegou problemas de agenda. Com o foguetório governista por causa do crescimento do PIB, o evento murchou.