Título: Economia contraria previsões mais alarmistas
Autor: Flávia Oliveira
Fonte: O Globo, 01/12/2004, Economia, p. 28

O desempenho excepcional da economia brasileira passados os três primeiros trimestres de 2004 surpreendeu alguns economistas que, desde o início do ano, mostravam-se céticos quanto à perspectiva de crescimento. Eles chegaram a duvidar que o Produto Interno Bruto (PIB) pudesse alcançar os 3,5% inicialmente previstos pelo governo, em razão da estagnação de 2003 e da política monetária restritiva que o Banco Central (BC) adotou no primeiro trimestre e voltou a usar a partir de setembro.

Júlio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), chegara a prever, em fevereiro, crescimento econômico de 2% para o país. E afirmara que a decisão do BC em não reduzir os juros no primeiro mês do ano representaria ¿uma meia-trava no crescimento¿, uma vez que investimentos já programados seriam retardados.

Flagrados em seu pessimismo, eles atribuem ao comércio exterior o fator imprevisível que está empurrando a economia brasileira num ritmo 5% superior ao de 2003. Mas renovam as críticas atribuindo ao BC a responsabilidade pelo país acompanhar o crescimento médio mundial, mas estar abaixo dos 6,5% estimados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para os países emergentes.

¿ Estou soltando foguetes com o desempenho do PIB, mas é bom frisar que a política monetária segurou a economia, impediu um crescimento maior. Nem num ano muito bom não conseguimos nos aproximar dos emergentes que estão na dianteira ¿ disse Almeida ontem.

Ricardo Carneiro, diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica da Unicamp, reforça o argumento. Segundo ele, numa comparação com 14 economias emergentes, a expansão apresentada até agora pelo Brasil só supera a de México e Filipinas.

¿ Estamos atrás da China, da Índia e até da Argentina ¿ afirmou o economista

Em maio, Carneiro referira-se à desaceleração do consumo das famílias e do investimento como justificativa para o PIB brasileiro não avançar em 2004 nem mesmo os 3,5% previstos no início do ano pelo BC. Almeida, Carneiro e um grupo de economistas tradicionalmente críticos da chamada corrente monetarista, associada às gestões do ex-ministro da Fazenda Pedro Malan e do atual, Antonio Palocci, passaram parte de 2004 chamando a atenção para os riscos de o PIB nacional, mais uma vez, decepcionar.

Além da Unicamp e do Iedi, o time inclui professores do Instituto de Economia da UFRJ e dirigentes da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e até ex-ministros como Luiz Carlos Mendonça de Barros. O presidente da CNI, Armando Monteiro Neto, afirmara em fevereiro que a ação do BC iria comprometer ou postergar a recuperação do investimento e da atividade produtiva. Ontem, o IBGE anunciou expansão acumulada no ano de 6,3% na indústria e de 11,8% nos investimentos.

A Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), em fevereiro, reduziu de 4% para 2,5% sua projeção de crescimento para 2004, em razão da interrupção da queda nos juros básicos.

As previsões foram feitas, principalmente, nos primeiros meses de 2004, diante da insistência do BC em manter a taxa Selic em 16,5%. Com isso, seria impossível a recuperação do emprego em 2004, outra previsão que as estatísticas têm desmentido ¿ a taxa de outubro caiu dois pontos percentuais em relação mesmo mês do ano anterior.

Carneiro admite que o PIB veio acima do que esperava e atribui o erro de previsão ao comércio exterior. As vendas externas, em volume, estão crescendo 30% sobre 2003.

¿ O comércio exterior fez a diferença. Nem os boletins de bancos, consultorias e do próprio BC previram o desempenho excepcional das exportações. Mas vamos ver o que essa política (monetária) produz sem o impulso externo ¿ diz.