Título: CERCO SE FECHA SOBRE PINOCHET
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Fonte: O Globo, 14/12/2004, O mundo, p. 32

Oex-ditador chileno Augusto Pinochet foi indiciado ontem em seu país sob acusação de participar na Operação Condor, a ação coordenada dos regimes militares sul-americanos para perseguir opositores nas décadas de 70 e 80. O general reformado foi acusado também pelo seqüestro permanente (desaparecimento) de nove pessoas e pelo assassinato de um militante comunista em 1977.

O juiz Juan Guzmán Tapia ordenou também a imediata prisão domiciliar do ex-ditador, mas os advogados de Pinochet recorreram minutos depois e conseguiram evitar que a ordem de prisão fosse dada até que um tribunal se pronuncie a respeito.

Apesar disso, grupos de parentes de desaparecidos políticos e de direitos humanos comemoraram a decisão, enquanto os advogados de defesa de Pinochet consideraram a medida ilegal. Guzmán afirmou que a decisão de indiciar o militar foi fácil depois de analisar as provas. Ao anunciar a acusação, ele frisou que o general tem condições físicas de ser processado:

¿ O general Pinochet foi declarado mentalmente apto para ser submetido a um juízo criminal no Chile com todas as etapas, declarações em resposta a indagações, acareações etc. E esta resolução tem uma segunda parte: ele é submetido a um processo como autor de nove seqüestros permanentes e um homicídio qualificado.

A preocupação do juiz Guzmán em sublinhar que o acusado tem saúde suficiente o processo se deve à sua última tentativa de condenar o ex-ditador. Em 2000, ele processou Pinochet pela Caravana da Morte, acusando-o pelo assassinato de dezenas de opositores nas primeiras semanas da ditadura (1973-1990). Porém, o general foi considerado inimputável por causa de uma suposta demência leve.

Terceiro processo contra ex-ditador

Para evitar que o fato se repita, Guzmán utilizou 30 das 52 páginas de sua acusação para fundamentar sua decisão de considerar Pinochet apto para o julgamento. Em setembro, ele se reuniu com especialistas que examinaram Pinochet, além de também interrogar Pinochet.

Ele disse que a opinião dos especialistas aponta para algumas limitações, mas afirma que em caso de acessos de tosse ou cansaço de Pinochet durante o julgamento poderá haver interrupções. Ele alegou que durante a entrevista, Pinochet demonstrou perfeito domínio do raciocínio.

¿Pude avaliar seu perfeito discernimento ao diferenciar claramente o importante do fútil, o principal do acessório, o bem do mal, e, por último, o que o incrimina do que não o incrimina¿, diz Guzmán na acusação. Entre as provas, ele citou uma entrevista de novembro de 2003 a uma TV de Miami na qual o general reformado mostrou estar plenamente consciente.

¿ É difícil expressar em palavras o que significou para nós escutar o juiz Guzmán falar deste processo ¿ festejou, emocionada, Viviana Díaz, presidente da Associação dos Familiares de Detidos Desaparecidos (AFDD).

O promotor Eduardo Contreras considerou a decisão judicial histórica:

¿ Isto significa o ápice de um trabalho de muitos anos, porque a Operação Condor é, sem dúvida, o caso mais emblemático pelo alcance internacional que tem, pela clara participação do ditador nos crimes, porque ele esteve presente desde o começo dando luz verde à reunião que gerou este pacto.

Já a defesa de Pinochet considerou que a medida fere os direitos humanos do ex-ditador.

¿ Isto não é mais que um novo capítulo da perseguição política mais implacável que já existiu neste país contra uma pessoa, o general Pinochet ¿ disse o advogado Pablo Rodríguez.

As acusações de ontem se somam a outros dois processos contra o ex-ditador. Ele é acusado de ter desviado ilegalmente milhões de dólares para o banco americano Riggs e também está sendo investigado pelo assassinato do ex-ministro da Defesa chileno Carlos Pratts, em 1974.