Título: Mudar o Estatuto
Autor:
Fonte: O Globo, 23/12/2004, Opinião, p. 6

A lei, na forma do Estatuto da Criança e do Adolescente, não permite que as crianças de rua recolhidas e levadas a abrigos sejam impedidas de sair dali. Os menores têm o direito de ir e vir, diz o ECA ¿ e por isso, mal são levados a uma instituição, geralmente saem de lá de imediato.

Se uma criança prefere ficar na rua ou na praia, não é simplesmente porque a alternativa que lhe é oferecida não é adequada. É também porque na rua ela ganha dinheiro pedindo esmolas ¿ ou assaltando; na Zona Sul, principalmente turistas.

É um problema grave, porque não se pode desobedecer à lei e manter os menores fora da rua à força. Primeiro, é preciso rever o Estatuto. Até que isso aconteça, a única política razoável é reforçar o policiamento ostensivo, ao mesmo tempo que se deve transformar os abrigos em instituições realmente capazes de acolher crianças e proporcionar-lhes todos os cuidados necessários.

Políticas de momento como a operação Turismo Seguro, sem continuidade, de pouco valem: tiram da rua as crianças que horas depois estão de volta. O resultado é que o assalto de turistas já é uma constante na cidade; e cada vez que um turista é assaltado ¿ por vezes com grande violência ¿ deteriora-se mais um pouco a imagem do Rio no exterior.

O policiamento, por ora, é a única forma de dar alguma segurança aos turistas ¿ e à população. A longo prazo, mais cedo ou mais tarde teremos de enfrentar um problema mais complexo. Porque continuará a haver crianças abandonadas enquanto não estiverem disponíveis, para as faixas mais carentes da população, meios de planejamento familiar.