Título: NOVO FLUXO MIGRATÓRIO
Autor: Chico Otavio
Fonte: O Globo, 29/12/2004, O País, p. 3

Um país em movimento

População cresce em áreas de agronegócio e sofre redução em cidades com economia em declínio

Buritis, a 300 quilômetros de Porto Velho, não é apenas o ponto de partida do chamado Arco do Desmatamento, uma extensa faixa que vai de Rondônia ao Pará. Desde ontem, quando o IBGE divulgou a pesquisa "Tendências demográficas", análise comparativa dos resultados do Censo de 2000, Buritis passou a ser também um fenômeno populacional. Entre 1991 a 2000, foi o município brasileiro que mais cresceu, a uma média anual de 29,3%.

Buritis simboliza um novo Brasil que brota de tabelas e mapas do IBGE. Boa parte dos municípios que mais cresceram no país, entre os dois últimos Censos demográficos, concentra-se no Arco do Desmatamento. A área da Amazônia Legal abrange quase a totalidade dos municípios de Roraima e do Amapá, assim como um grupo de cidades situadas no sudeste do Pará, no norte de Mato Grosso e no sudoeste do Amazonas.

Madeira foi primeiro objetivo dos migrantes

A história da capixaba Inês Marinato, vice-prefeita de Buritis, ajuda a entender esse processo. Ela e sua família chegaram a Rondônia há 14 anos, atraídos pelos negócios ligados à exploração da madeira. Na época, as serras elétricas e os tratores abriam a imensa fenda em curva que logo se tornaria um símbolo da degradação ambiental na borda da Amazônia. O marido de Inês chegou a ser sócio de uma serraria. Mas a madeira começou a desaparecer, ao mesmo tempo que crescia o chamado agronegócio.

- Compramos um pedaço de terra e começamos a plantar café. Depois, quando o preço caiu, adquirimos umas cabeças de gado - relata a vice-prefeita.

Outros colonos fizeram o mesmo e o município, desde então, não parou de crescer. De acordo com o IBGE, em 1991 Buritis registrava uma população de apenas 3.601 habitantes. Em 2000, este número saltou para 25.668 moradores e, este ano, aproxima-se dos 45 mil habitantes, parte significativa empregada no campo e um grande contingente vivendo da atividade comercial.

- A pesquisa mostra, ao contrário do que muitos dizem, que o agronegócio gera, sim, empregos e oportunidades. Tem um efeito multiplicador - afirma o engenheiro agrônomo e ex-presidente do Incra Xico Grazziano.

"Tendências demográficas" analisa as tendências de crescimento ou declínio no período 1991-2000. O IBGE constatou, por exemplo, que apenas 654 municípios (11,9% dos 5.507 existentes na época do último Censo) apresentaram ritmo de crescimento anual superior a 3%. Eles concentravam 25,6 milhões de habitantes, o que correspondia a 15,1% da população do país em 2000.

Além do Arco do Desmatamento, fazem parte do conjunto seis capitais, das quais cinco estão no Norte (Manaus, Macapá, Rio Branco, Boa Vista e Palmas) e Florianópolis, bem como os pólos localizados no nordeste e no litoral de Santa Catarina, nas áreas metropolitanas do Paraná e de São Paulo e na área litorânea do Rio de Janeiro. Na região Centro-Oeste, também destacaram-se as cidades do entorno de Brasília, fruto da ocupação demográfica dos últimos 20 anos.

Palmas foi a capital com a mais alta taxa de crescimento (21,4% ao ano), provavelmente associada ao surgimento do novo estado, com todo o esforço que isso representa.

A pesquisa revela ainda que 1.496 municípios (27,2% do total) sofreram perda populacional de 1991 a 2000, e quase 40% (2.193 municípios) apresentaram um ritmo de crescimento anual de até 1,5%, abaixo da média nacional de 1,6% ao ano.

- Os municípios que mais perderam são, justamente, os de piores indicadores sociais, como alta taxa de analfabetismo e elevados índices de fecundidade e mortalidade infantil. Em 99% dos casos, são municípios com até 50 mil habitantes - explicou Nilza Pereira, coordenadora da pesquisa do IBGE.

Grandes pólos de perda populacional localizam-se no extremo norte do Rio Grande do Sul, no oeste de Santa Catarina, em áreas próximas à fronteira com a Argentina, e num corredor de municípios que vai de Minas Gerais até a Bahia, entre as BRs 101 e 116.

Metrópoles crescem menos que a média nacional

As grandes metrópoles brasileiras, que acolheram ao longo de sua história milhares de migrantes, passaram a perder população para outras cidades nos anos 90. A pesquisa "Tendências demográficas", do IBGE, situa Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre entre os 2.193 municípios (39,8% do total dos cidades brasileiros) que tiveram crescimento de até 1,5% ao ano, com percentuais abaixo da média nacional de 1,64% (1991-2000).

Estes municípios, apesar da estagnação populacional e dos baixos índices de fecundidade de seus moradores, ainda concentravam 66,1 milhões de habitantes em 2000 (38,9% da população total do país).

Com um crescimento médio de 1,5% a 3% ao ano ficaram 1.164 municípios (21,1% do total), que concentravam 63,5 milhões de habitantes, ou 37,4% da população total do Brasil. Nesse conjunto, estavam 15 capitais: Salvador, Fortaleza, Brasília, Curitiba, Belém, Goiânia, São Luís, Maceió, Teresina, Natal, Campo Grande, João Pessoa, Cuiabá, Aracaju e Porto Velho.

O IBGE encontrou importantes pólos de municípios com crescimento médio na área metropolitana de Porto Alegre, num corredor central em Santa Catarina, nas áreas metropolitanas de São Paulo, na área litorânea do Rio de Janeiro, no Espírito Santo e em grande parte do litoral nordestino.