Título: EXÉRCITO: ESTAMOS COM O GOVERNO
Autor: Cristiane Jungblut e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 30/12/2004, O País, p. 3

General diz que Força fará o que Planalto determinar sobre arquivos do regime militar

Ocomandante do Exército, Francisco Albuquerque, disse ontem que a Força está com o governo e fará o que o Planalto determinar sobre a abertura dos arquivos do regime militar. Albuquerque, que resistira a divulgar nota lamentando a morte do jornalista Vladimir Herzog em recente episódio que resultou na demissão de José Viegas do Ministério da Defesa, disse ainda que deseja que "todos encontrem os restos mortais de seus parentes, porque isso é humano". Reafirmou, porém, que o Exército não tem documentos sobre a Guerrilha do Araguaia.

Apesar de entre os militares haver resistência à abertura dos arquivos, o general negou isso oficialmente:

- Nunca houve resistência por parte do Exército. Estamos com o governo, o governo nos orienta. E atendemos a toda orientação legal, a toda orientação que vier. Não há por que temer, não há por que se preocupar. Vamos olhar para frente.

Foi a primeira vez que o comandante do Exército falou abertamente sobre o assunto, desde a crise iniciada com o aparecimento de fotografias erroneamente identificadas como sendo do jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975. Em outubro, quando as fotos apareceram, o Exército divulgou nota justificando ações do regime militar, considerada equivocada pelo Palácio do Planalto, que exigiu retratação. A segunda nota foi divulgada após uma tensa reunião entre Lula, Albuquerque e Viegas. Ontem, o comandante afirmou:

- Estejam certos de uma coisa: como qualquer cidadão, desejamos que todos encontrem os restos mortais de seus parentes. Isso é humano. Nós colaboramos, sempre colaboramos, e desejamos que isso realmente aconteça - disse Albuquerque.

General: arquivos já estão disponíveis

Ao ser perguntado se o Exército já está enviando os documentos à recém-criada Comissão de Averiguação e Análise de Informações Sigilosas, o comandante disse que o Exército está "com sua documentação à disposição" e que está "trabalhando de acordo com a lei". Mas disse que "um dia será possível mostrar à sociedade que não há com o que se preocupar". O governo criou a comissão, coordenada pelo chefe da Casa Civil, José Dirceu, para analisar documentos sigilosos e decidir quais devem ser liberados. Dirceu já defendeu que os arquivos da ditadura sejam imediatamente liberados.

- Isso aí, qualquer dia, a gente talvez possa falar. É preciso esclarecer, mostrar para a imprensa. Estamos trabalhando de acordo com o que estabelece a lei, estamos com a nossa documentação à disposição. Então, quando for possível realmente mostrar à imprensa e à sociedade, vocês vão ver que não há com o que se preocupar e estaremos atendendo a todos os anseios - disse o general.

Albuquerque deu entrevista após a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao 32º Grupo de Artilharia de Campanha do Exército. Ao afirmar que não existem mais documentos relativos à Guerrilha do Araguaia em poder do Exército, ele disse que há informações suficientes em outros locais para se fazer as análises históricas.

- Existem aí documentos do passado que mostram que realmente não há mais essa documentação. E existem outros lugares em que essa documentação existe e está com quantidade suficiente para se fazerem as análises que se deseja. As coisas estão andando bem, o governo está conduzindo as ações e temos certeza de que vamos chegar a bons termos - disse Albuquerque.

O general reagiu com bom humor ao ser perguntado sobre os problemas que enfrentou este ano no comando do Exército. No episódio das supostas fotos de Herzog, Albuquerque foi repreendido e quase deixou o governo:

- Passado é passado. A gente tem que olhar sempre para frente.

Legenda da foto: O GENERAL ALBUQUERQUE, Lula e dona Marisa observam recrutas do projeto Soldado Cidadão: o comandante do Exército negou resistências à abertura dos arquivos