Título: CIDADE PEQUENA, POBREZA MAIOR
Autor:
Fonte: O Globo, 30/12/2004, Economia, p. 21

IBGE diz que municípios com população menor têm renda, trabalho e educação piores

Os pequenos municípios do Brasil têm mais famílias pobres, um mercado de trabalho mais precário e pior acesso à educação. Estas são as principais conclusões de um estudo, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgado ontem, com base no Censo 2000. A pesquisa Indicadores Sociais Municipais mostra que, nas cidades entre 5 mil e 50 mil habitantes, mais de um quinto das famílias são miseráveis, com renda inferior a um quarto de salário-mínimo per capita. Nos municípios com mais de 500 mil habitantes, essa parcela não chega a 7%. E, na média nacional, é de 12,8%. Na época do censo, o salário-mínimo era de R$151.

Quando se considera quem ganha até meio salário-mínimo per capita - o governo federal usa esse parâmetro, mas com a referência do salário-mínimo de 2002 (R$200), para classificar as famílias aptas a se inscreverem nos programas de transferência de renda - são 42,5% dos domicílios nas cidades entre 10 mil e 20 mil habitantes, contra apenas 15,6% nos municípios com mais de 500 mil habitantes.

A técnica do IBGE Bárbara Cobo explica que parte dessa diferença é amenizada pelo chamado rendimento não-monetário. Nas cidades menores, mais próximas da zona rural, as famílias contam com a horta ou os animais do quintal para garantir seu sustento. Ainda assim, a disparidade de renda é significativa e está relacionada a poucas oportunidades no mercado de trabalho e a um grau de instrução menor, diz Bárbara.

Cidades com até 20 mil habitantes têm mais trabalhadores na informalidade do que empregados registrados. Nos municípios com menos de cinco mil habitantes, 21,1% dos ocupados são empregados sem carteira, contra 18,3% de trabalhadores com carteira. Segundo o IBGE, a falta de opções no mercado formal leva os moradores a trabalharem em atividades familiares, de cultivo agropecuário ou não, ou por conta própria.

Analfabeto funcional: índice chega a 40%

Em Lagoa do Carro, cidade de 13 mil habitantes a 61 quilômetros de Recife, o bordado é a principal atividade das mulheres. Cerca de 500 vivem dessa atividade sem, no entanto, tirar sequer um salário-mínimo por mês. Aos 18 anos, Joseilda Silva cursa o segundo ano do ensino médio numa escola pública. Órfã de pai e mãe, ela borda desde os 7 anos e ganha de R$10 a R$12 por metro quadrado de tapete concluído:

- Não sei ainda que carreira vou abraçar. Mas uma coisa é certa: vou trabalhar de dia e bordar em casa à noite. Do jeito que está não dá.

Joseilda, porém, pode se considerar privilegiada por chegar ao ensino médio sem grande defasagem entre idade e anos de estudo. Em cidades como Lagoa do Carro, adolescentes com 14 anos têm, em média, 4,4 anos de estudo, quando deveriam ao menos ter concluído o ensino fundamental (oito anos de estudo). É uma defasagem bem superior à dos municípios com mais de 500 mil habitantes, onde a escolaridade média nessa faixa etária é de 5,6 anos.

Os pequenos municípios também têm mais analfabetos funcionais: dois quintos (cerca de 40%) dos moradores das cidades até 50 mil habitantes estudaram menos do que quatro anos. Nos grandes, de mais de 500 mil habitantes, essa parcela é só de 15,6%. Para o IBGE, além da dificuldade de acesso à educação, a baixa exigência do mercado de trabalho pode explicar o pequeno grau de instrução.

- Para cursar o ensino médio, às vezes é preciso se deslocar para outros municípios. Faculdade, então, nem se fala - explica Bárbara.

Dados detalhados

A pesquisa Indicadores Sociais Municipais foi feita com base no Censo Demográfico 2000. O Censo investigou 54 milhões de domicílios, em todos os municípios brasileiros. Um questionário básico foi aplicado a toda a população brasileira e outro, mais abrangente, foi respondido por uma amostra de 20 milhões de pessoas, em 5,3 milhões de domicílios. O IBGE já havia divulgado indicadores genéricos dos municípios com base no questionário básico.

Agora, o instituto compilou as respostas do questionário completo. A pesquisa divulgada ontem apresenta informações inéditas sobre renda, mercado de trabalho, educação e aposentadorias, agrupadas pelos diferentes tamanhos dos 5.560 municípios do Brasil.