Título: Ameaça cumprida
Autor: Maiá Menezes
Fonte: O Globo, 05/01/2005, Rio, p. 12

A promessa feita pela governadora Rosinha Garotinho e pelo presidente regional do PMDB, Anthony Garotinho, na campanha eleitoral, agora virou dívida para a prefeitura de Nova Iguaçu. No penúltimo dia do ano passado, o então prefeito, Mário Marques (PMDB), publicou decreto no Diário Oficial suspendendo o convênio firmado entre o estado e o município para drenagem, pavimentação e urbanização de ruas do município. Em comícios em Nova Iguaçu, o presidente do PMDB e a governadora ameaçaram boicotar o município caso o atual prefeito, Lindberg Farias (PT), fosse eleito.

O resultado é a paralisação de pelo menos 15 frentes de obras da cidade. Com a rescisão, o estado vai deixar de repassar ao município R$ 32,7 milhões, que pagariam obras que já estão paralisadas. O total do convênio foi de R$ 114 milhões, verba fundamental para o município: o orçamento da Secretaria de Obras, para 2005, é de R$ 115 milhões. Na rubrica ¿Obras e Instalações¿, o valor previsto é de R$ 81 milhões.

¿ Eu não sei se o (ex) prefeito faria isso sem o consentimento da governadora, porque eles têm uma relação muito próxima. Espero que isto não tenha sido combinado com o governo do estado. Se foi, eles (o casal Garotinho) cumpriram o que foi prometido e rechaçado pelo país inteiro ¿ disse o prefeito de Nova Iguaçu, que vai levar o caso ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com quem se encontra hoje, em Brasília.

Prefeito diz que vai marcar audiência

Lindberg pretende agendar encontro com a governadora para tentar retomar o convênio, porque admite não ter como pagar as obras. Ele lembra que se encontrou com Rosinha e Garotinho há 15 dias e que o ambiente entre eles é de paz, diferentemente dos desentendimentos do período eleitoral.

¿ Esta é uma atitude vingativa do ex-prefeito com a população. Uma vingança nefasta, que vai ter uma conseqüência maior, porque as obras estão em curso e vão acabar se perdendo ¿ disse o prefeito recém-empossado.

O ex-prefeito Mário Marques ¿ agora cotado para assumir a Secretaria Especial da Baixada Fluminense ¿ disse, ao ser perguntado sobre o decreto, que não se lembrava da suspensão dos convênios. Depois, admitiu que o cancelamento foi feito a pedido de Rosinha ¿para efeito de fechamento de caixa¿ (para não deixar restos a pagar). Marques negou que o ato administrativo trará prejuízos para a cidade que, segundo ele, já recebeu quase todas as obras de infra-estrutura previstas no acordo com o estado.

¿ Este é um convênio antigo, celebrado na gestão do Bornier (Nelson Bornier, seu antecessor), em 1999. Quase tudo já foi feito e o cancelamento foi para fechamento de caixa ¿ disse o ex-prefeito, que, durante a campanha, afirmara que os projetos sociais do estado seriam paralisados no município caso Lindberg fosse eleito.

Na conversa com o presidente, Lindberg vai pedir ainda agilidade para a construção do anel rodoviário no estado e verbas para projetos de saneamento na Baixada. Lindberg foi escolhido presidente da Associação de Prefeitos da região. Mesmo garantindo não ter esta intenção, o prefeito vai criar outra linha de atrito com a governadora: vai defender que a Petrobras construa uma refinaria em Itaguaí, e não no Norte Fluminense, como defende Rosinha desde o começo do governo. Lindberg também espera solidariedade de Lula para o caso do rompimento do convênio:

¿ Ele (o presidente) disse que não ia admitir retaliação ¿ disse Lindberg, lembrando que Lula reagiu às ameaças do casal Garotinho dizendo que supriria de recursos os municípios que se sentissem segregados pelo governo do estado.

Estado: gestora da obra é prefeitura

O secretário estadual de Integração Governamental, Luiz Rogério Magalhães, lembra que os termos do convênio são claros: o andamento das obras é responsabilidade da prefeitura, que recebe o repasse do estado. Ele, no entanto, deixou abertas as portas para uma nova negociação do estado com Nova Iguaçu e garantiu que a medida tomada pelo ex-prefeito Mário Marques foi unilateral:

¿ O Mário Marques quis evitar uma punição pela Lei de Responsabilidade Fiscal, porque deixaria uma dívida resultante da contrapartida obrigatória pelo convênio. Mas não há motivo para a governadora deixar de receber o Lindberg. Sempre lembrando que o gestor é a prefeitura. O que o ex-prefeito fez foi tirar o cheque especial que garantiria o pagamento ¿ disse o secretário, afirmando que cabe ao município uma contrapartida de 10% do valor total de cada obra.