Título: Serviço público, um problema essencial
Autor: Ana Cecília Santos
Fonte: O Globo, 05/01/2005, Economia, p. 22

Consumidor e empresas de serviços públicos não se entendem há tempos. De dezembro de 2003 a novembro de 2004, o setor foi responsável por 30,84% do total de 16.930 queixas recebidas pela seção ¿Defesa do Consumidor¿. De acordo com especialistas, a concentração de cartas sobre serviços públicos é até natural, afinal ninguém quer viver sem luz, gás, água e telefone e, por isso, o consumidor exige um bom serviço por parte das empresas.

Mas entre os serviços essenciais nenhum outro supera o de telefonia quando o assunto é reclamação. Do total de queixas sobre serviço público, 80% se referem a este setor ¿ que reúne as operadoras fixas, móveis e de longa distância. Em função deste volume, as reclamações distorcem os dados dos serviços públicos. Por isso, a partir de 2005, a seção vai ganhar mais um setor, o da telefonia.

Além dos serviços públicos, as queixas são divididas por outros 15 setores: produtos, serviços, financeiro, automobilístico, venda a distância, cartão de crédito, editorial, transportes, saúde, órgãos do governo, alimentos e bebidas, seguros, diversão, imobiliário e educação.

Problemas com telefonia à parte, as queixas nos serviços públicos se concentram em três áreas: energia elétrica, água e gás. Além destas há ainda queixas sobre as concessionárias que administram rodovias e sobre os Correios.

Forma de cobrança é a principal queixa

Os especialistas admitem que a privatização resultou em uma melhoria na qualidade, mas ressaltam que os serviços públicos ainda estão longe de atender às demandas dos usuários. Marcus Diegues, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), diz que a entidade é contra a privatização por entender que água, energia e gás são bens estratégicos e por isso não devem ser objeto de comércio para não ficar sob o controle da iniciativa privada.

¿ O problema é que nas mãos do governo pouco se avança na qualidade e na universalização dos serviços, especialmente de água e saneamento básico, pois são obras que não aparecem ¿ explica Diegues.

O diretor do Departamento Nacional de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), Ricardo Morishita, afirma que um dos principais problemas no setor de serviços públicos é a falta de informação:

¿ O consumidor precisa de informações sobre o serviço que está utilizando e sobre os direitos que tem. Assim, ele poderá exigir um controle maior das empresas privatizadas e do trabalho das agências reguladoras.

Uma das queixas mais comuns nesta seção, e que diz respeito a todas as áreas que compõem os serviços públicos, é o questionamento das cobranças apresentadas pelas empresas, sejam públicas ou privadas. Diegues destaca que um dos entraves da cobrança é o cálculo pela média de consumo.

¿ A cobrança por média irrita o consumidor porque traz prejuízo. Só deve ser aceita em situações extraordinárias, como a impossibilidade de a empresa fazer a leitura correta do consumo por falta de acesso ao medidor ¿ afirma o advogado do Idec.

Idec defende a abolição da taxa mínima

O corte indevido no fornecimento é outro problema que atormenta os consumidores. Para Diegues, mesmo em caso de inadimplência, o serviço não poderia ser suspenso por ser essencial, conforme previsto no artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor (CDC):

¿ Existem instrumentos jurídicos para se cobrar a dívida do consumidor inadimplente. Portanto, a empresa não deveria usar o corte no fornecimento do serviço como meio para obrigar o cliente a pagar o débito.

Outro ponto de conflito observado nas queixas a esta seção são as taxas mínimas, cobradas pelas empresas independentemente da utilização ou não do serviço. Para Diegues, o consumidor só pode ser obrigado a pagar por aquilo que efetivamente consumiu. O Idec é uma das entidades mais ativas no combate às taxas mínimas, com várias ações na Justiça que pedem o fim destas cobranças.

Na área de energia, Morishita também acredita que a chave está no acesso a informações claras, especialmente em relação a gastos, taxas pagas na conta e classificação das faixas de consumo, para que o usuário possa gerenciar melhor o seu gasto.

Morishita defende uma maior participação dos consumidores nas audiências e consultas públicas promovidas pelas agências reguladoras dos serviços públicos. Sobre isso, o DPDC enviou ao Congresso um projeto de lei que prevê que as agências custeiem um especialista, cuja função será explicar tecnicamente a mudança na regulamentação que estiver em consulta pública aos funcionários do Departamento, permitindo que o órgão defenda melhor os direitos do consumidor. COLABOROU Nadja Sampaio

DEFESA DO CONSUMIDOR

ONDE RECLAMAR ? O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) fica na Esplanada dos Ministérios, Bloco T - Edifício Sede - Sala 520 Cep: 70064-900 Brasília (DF) - tel.: (61) 429-3942 e e-mail: dpdc@mj.gov.br, e funciona das 8h às 18h