Título: `Quinze mil corpos apodrecendo ao sol¿
Autor: COLOMBO
Fonte: O Globo, 05/01/2005, O Mundo, p. 25

Nas ruas de Banda Aceh o que se vê é um amontoado de destroços de prédios, carros destruídos e corpos. Descrita pelo porta-voz da Cruz Vermelha na região, o suíço Martin Unternaehrer, a cena ilustra o caos em que a região, a mais afetada pelo maremoto, encontra-se após o desastre. Juliana Braga Do GLOBO ONLINE

Quanto tempo o senhor acha que será necessário para que Banda Aceh seja reconstruída?

MARTIN UNTERNAEHRER: Ninguém tem como responder a essa pergunta. Metade da cidade foi destruída. Vários funcionários do governo morreram, o que dificulta ainda mais o trabalho. Diversos colegas da Cruz Vermelha perderam 20, 30 parentes nesse desastre, mas continuamos a trabalhar. Nossos engenheiros estão avaliando os prédios que ainda estão de pé. É preciso determinar o que pode ser reparado, reconstruído. Só posso dizer que vai levar muito tempo.

Além do problema da escassez de comida, qual é o maior desafio para as equipes de ajuda humanitária em Banda Aceh neste momento?

UNTERNAEHRER: Em primeiro lugar, temos que assegurar que a população tenha acesso a água potável, porque vários reservatórios de água foram destruídos e o lençol d¿água foi contaminado com sal. É necessário também criar abrigos para que os cerca de 50 mil desalojados tenham onde morar. Em termos de suprimento de comida, não é um caso de emergência, mas também temos que garantir que a população tenha acesso. E há ainda o aspecto psicológico. Muitas pessoas estão traumatizadas e perambulam pela cidade procurando parentes.

A identificação de corpos tem sido um grande problema nas nações atingidas. Como isso está sendo feito em Aceh?

UNTERNAEHRER: Tem sido um processo muito difícil. A Cruz Vermelha e o Exército têm feito um trabalho coordenado para isso. Essa semana, tivemos que retirar 15 mil corpos que estavam apodrecendo ao sol. Muitas pessoas morreram. Estamos tentando identificar os mortos através de informações dadas por seus parentes.

Segundo a ONU, a ameaça de doenças pode duplicar o número de mortos. A Cruz Vermelha já registrou algum caso de doenças ligadas à tragédia?

UNTERNAEHRER: É um perigo, mas graças a Deus isso ainda não aconteceu. Há apenas casos isolados de doenças como diarréia, mas nada em grande escala.

Recentemente, o governo da Indonésia afirmou ter desistido de contar os mortos. O que o senhor pensa disso?

UNTERNAEHRER: Não tenho essa informação oficial, mas acredito que o governo quis dizer que não será fácil dar um número oficial de mortos rapidamente. Estava dirigindo em Banda Aceh e vi metros de concreto e carros empilhados. No meio disso tudo, há muitos corpos. Vai levar muito tempo para que o número total de mortos seja conhecido.