Título: DOIS TORNADOS NUM LUGAR SÓ
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Fonte: O Globo, 04/01/2005, O País, p. 3

tornados nun Cidade de SC registra o fenômeno duas vezes no dia enquanto gaúchos enfrentam seca

Olhamos para o céu e estava horrível, contou Marlene Figueiró, de 50 anos, descrevendo um dos dois tornados que atingiram ontem a cidade de Criciúma, a maior da região Sul de Santa Catarina, a 290 quilômetros de Florianópolis. A força dos ventos deixou cerca de 70 casas destruídas e mais de 300 pessoas desabrigadas. Três ficaram feridas e uma senhora de 68 anos, Daisi Vieira Pinto, que sofria de problemas cardíacos, teve um infarto ao ver um dos tornados. Até as 21h de ontem, cerca de 40 mil pessoas em Criciúma continuavam sem fornecimento de energia elétrica.

O primeiro tornado, classificado como F2 (a escala vai até 5), começou a se formar por volta das 15h. Os ventos chegaram a 200 quilômetros por hora e em pouco mais de sete minutos os estragos estavam feitos. Após a passagem do fenômeno, a chuva continuou caindo forte por duas horas. O segundo tornado foi registrado cerca de uma hora depois e, segundo os especialistas, teve a mesma intensidade do primeiro.

Moradores tentavam retirar a lama e a água acumuladas nas casas, a maior parte destelhada. Em conjunto, a prefeitura de Criciúma, o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil, a Polícia Militar e o Exército recolhiam as pessoas dos lugares atingidos para serem alojadas no Ginásio Municipal de Esportes. Muitos preferiram ir para a casa de parentes.

¿ Percebi que algo estava errado quando vi um sinal de luz. Pensamos que era fogo, que vinha do terminal em direção ao nosso bairro. Fechei tudo e saí correndo. Depois percebemos que não era fogo, e sim uma poeira preta que parecia de carvão. Foi muito rápido. A poeira parou e se transformou num funil. Foi nesta hora que começou a fazer força e vir para nossa direção. Corremos, eu e outros rapazes, para debaixo da igreja. Foram uns 30 segundos de vento forte e, quando saímos, estava tudo estragado ¿ contou Jailson Peres, de 16 anos.

Moradora correu para salvar filhos

Jailson tentava salvar os móveis da casa do primo, que estava quase sem telhado.

¿ Meu primo e a mulher estão trabalhando, nem sabem que aconteceu isso aqui. Tudo está molhado, metade do telhado caiu e agora estamos levando os móveis para lugares mais secos ¿ disse o rapaz.

Moradora da Rua 34, Elizabete Maximiliano estava em outro bairro quando soube do perigo. Como tinha deixado os quatro filhos em casa, voltou correndo. No caminho, viu o tornado.

¿ Estava perto de casa quando vi que o tornado vinha na minha direção. Na hora, comecei a chorar e só pensei nos meus filhos. Só queria chegar em casa para protegê-los. Vi muitas telhas voando ao meu redor.

De todos os bairros atingidos pelo tornado, a Vila Manaus foi a que teve mais prejuízos. Várias casas destelhadas, árvores arrancadas, placas caídas e dezenas de pessoas sem rumo.

¿ Só percebemos quando o barulho ficou muito alto. Peguei meus netos e corri para o banheiro. Agora é esperar a chuva passar e limpar tudo ¿ contou Marlene.

Especialista diz que fenômeno é atípico

O climatologista Ronaldo Coutinho, de São Joaquim (SC), afirmou que a formação do tornado é atípica na região, apesar de um outro, mais fraco, ter passado pela cidade há menos de dez dias. Segundo ele, até agora foram contabilizados três tornados em menos de um mês.

¿ O fenômeno não é comum, mas está se repetindo. Na semana retrasada, poucas pessoas notaram a formação do funil, já que foi de fraca intensidade.

A meteorologista Marilene de Lima avalia que a região Sul do estado é propícia geograficamente à passagem de um tornado.

¿ Os ventos vêm do mar e quando chegam na encosta (serra), criam uma corrente intensa, dando condições necessárias para a formação do tornado. A grande nuvem escura tem a formação de um funil que, em forma de um aspirador, suga tudo o que estiver na frente ¿ explicou. Para os especialistas, o problema é a dificuldade para os alertas à população.

No RS, emergência por causa da seca

Enquanto chove forte em Santa Catarina e no estado de São Paulo, quase 20 municípios do Rio Grande do Sul estão em situação de emergência por causa da seca que atinge as regiões Norte e Nordeste do estado. Segundo a Coordenadoria da Defesa Civil no estado, as prefeituras de Aratiba, na divisa com Santa Catarina, e Paulo Bento, a 400 quilômetros de Porto Alegre, já sofrem grandes prejuízos com a falta de chuva.

A Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec) fez um alerta ontem às defesas civis do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Minas Gerais, do Distrito Federal, de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul contra a ocorrência, até amanhã, de chuvas fortes, raios e ventos com até 60 quilômetros por hora.

De acordo com a Defesa Civil, os temporais, previstos principalmente para as tardes e noites, poderão causar alagamentos, além de deslizamentos de encostas e de pedras.