Título: VIÚVA DE BRASILEIRO MORTO NOS ANDES CRITICA SOCORRO
Autor:
Fonte: O Globo, 10/01/2005, O PAÍS, p. 5
Jornalista diz que ficou com pernas paralisadas e não poderia descer mais o Aconcágua, como foi orientada
SÃO PAULO e RIO. A jornalista Rita Bragatto, de 34 anos, mulher do dentista Eduardo Alvarenga da Silva, de 40 anos, que morreu quando descia o Aconcágua, o pico mais alto das Américas, na Argentina, reclamou ontem, em entrevista ao ¿Fantástico¿, da Rede Globo, do socorro prestado a ela e ao marido pelas equipes de resgate quando o casal descia a montanha, à noite, em meio a um frio intenso, de 30 graus negativos.
¿ Eu acho que foi falho o atendimento, porque começamos a chamar no rádio de madrugada e até de manhã ninguém tinha ido nos socorrer ¿ afirmou Rita.
Ela lembrou que ao pedir ajuda à base mais próxima para o que chamou de ¿travamento das pernas¿ ¿ já que não conseguia caminhar ¿ e para o marido, que também passava mal, ouviu como resposta que o casal deveria continuar descendo a montanha. O pedido foi feito às 23 horas da quinta-feira, quando o casal tentava descer o pico, depois de atingir seu cume no fim da tarde.
¿ Como eu poderia descer naquelas condições? ¿ lembrou Rita, que disse estar fisicamente bem agora, precisando se reidratar.
Corpo de Eduardo deve ser trazido hoje para o Brasil
A jornalista chegou a entrar em estado de choque, após a morte de Eduardo. Rita disse que a lembrança da tragédia a mantém acordada:
¿ Eu realmente estou sem dormir, sem conseguir descansar e sem assimilar o que a gente passou naquela noite. Perdi o homem que eu amava, o amor da minha vida ¿ disse ela no ¿Fantástico¿.
O corpo de Eduardo deve ser liberado hoje pelas autoridades argentinas, para ser enviado ao Brasil, onde será enterrado. O casal vivia em Sorocaba, no interior paulista. Ontem o cadáver foi resgatado do alto da montanha e levado ao acampamento mais abaixo, onde Rita recebeu os primeiros socorros.
Do acampamento, Rita e o corpo do marido foram levados de helicóptero a uma localidade próxima da montanha. No início da tarde, seguiram de carro para Mendoza, capital da província onde fica o Aconcágua.
¿ Acho que Deus me deu outra vida ¿ dizia ontem a jornalista.
Irmão de jornalista está na Argentina desde sábado
Desde sábado já estavam em Mendoza Cássio Bragatto, irmão da jornalista, e Jorge Alvarenga da Silva, irmão de Eduardo. Com a ajuda do consulado brasileiro, Cássio e Jorge cuidavam ontem dos documentos junto ao Instituto Médico-Legal de Mendoza para liberar o corpo de Eduardo, que deverá ser sepultado em Sorocaba.
Eduardo e Rita subiram o Aconcágua sem guia. O diretor de Recursos Naturais Renováveis de Mendoza, responsável pela fiscalização do Aconcágua, Leopoldo León, disse que a ausência de ajuda pode ter contribuído para a morte do brasileiro.
Para León, pode ter sido um erro também o horário de chegada ao cume do Aconcágua pelo casal. Eduardo e Rita chegaram ao topo somente no fim da tarde de quinta-feira, entre 17h e 18h.
A volta, à noite, é mais difícil, segundo informou o funcionário. E os dois foram vencidos pela fadiga, agravada pelo frio e pela desidratação. Eles não tiveram forças para chegar à base mais próxima, sendo encontrados desacordados por um guia norueguês, Lars Oslo, que subia o pico com um outro grupo de alpinistas, na sexta-feira, a 600 metros do pico.
Vítima morreu pouco antes de chegar a acampamento
Oslo chamou por rádio os guardas do parque do Aconcágua e a patrulha de resgate. Os grupos de salvamento subiram para auxiliar Eduardo e Rita, mas o cirurgião-dentista já mostrava muitos problemas de saúde. Ele morreu de parada cardíaca pouco antes de chegar ao acampamento-base Berlín, que serve de apoio para os montanhistas que visitam o Aconcágua, a 6.100 metros de altura
O acidente ¿ na mesma face sul do Aconcágua ¿ fez lembrar a tragédia que vitimou três alpinistas brasileiros em 1998: o líder da expedição, Mozart Catão, e seus companheiros Alexandre Oliveira e Othon Leonardos. Eles iniciaram a expedição em 31 de janeiro e chegaram aos 5.300 metros. Mas em 2 de fevereiro o tempo piorou e eles tiveram de parar. No dia 3, às 20h, uma avalanche arrastou Mozart, que não estava preso por cordas. Alexandre, que estava amarrado, ficou preso numa saliência da montanha e também morreu. Othon manteve contato com a base por duas horas e meia, até não mais responder aos chamados. Recentemente, no dia 29 de novembro, a alemã Petra Ilg também havia morrido, em outra expedição no pico.