Título: EXCESSO
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Fonte: O Globo, 08/01/2005, OPINIÃO, p. 6

Na data de 23 de dezembro de 2003, entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento, lei 10.826.

A idéia passada pelo governo, quando da criação desta lei, foi desarmar o ¿homem de bem¿, tirando de circulação aquela arma guardada em casa, que sempre trouxe risco à família através de um eventual acidente.

Pretendeu-se, ainda, evitar que essa mesma arma de fogo fosse usada em outras situações corriqueiras, como brigas de trânsito e etc.

Como podemos observar, a tão falada violência que assola o país atualmente não é esta violência visada pelo legislador, mas sim a dos bandidos, com seus seqüestros-relâmpago, assaltos, roubos, assassinatos.

Ou será que o legislador imaginou que o bandido realmente irá levar seu fuzil AR-15 para registro junto ao Sistema Nacional de Armas (Sinar)?

A título de informação, no Brasil temos cerca de 20 milhões de armas sem registro!

Deixando de lado, por ora, os aspectos sociais, quanto à análise jurídica do Estatuto do Desarmamento temos como controvertida a proibição do arbitramento de fiança para alguns crimes previstos nesta lei, o que, em alguns casos, nos parece excessivamente onerosa ao agente, levando ainda em conta a situação carcerária do nosso país.

Também existem algumas distorções em relação às penas impostas. Uma simples exemplo elucida uma questão controvertida: se alguém que recebeu de herança uma arma calibre 45 ¿ considerada arma de uso restrito pelo Exército ¿ e por desconhecer a lei (o que é mais comum do que se imagina) for pego portando esta arma, comete o crime previsto no artigo 16 do estatuto, podendo ser condenado à pena maior que a por crime de lesão corporal grave.

Este excesso do legislador, verificado na estipulação das penas previstas para os crimes de arma de fogo, contraria a ordem jurídica mundial e afronta a estratégia de política criminal implementada por outros países, já que atualmente se caminha para a descriminalização de maior número de condutas com menor potencial lesivo à sociedade.

Podemos perceber que esta lei peca pelos excessos e pela errônea visão dos legisladores, pois, a pretexto de se criar uma sociedade menos violenta, cria-se mais uma lei penal que não contribuirá de maneira significativa para a paz social, além de afogar o Judiciário com milhares de processos de menor importância.