Título: `Aqui não dá mais para ficar¿
Autor: Gio Mendes, Ana Paiva e Luis Kawaguti
Fonte: O Globo, 13/01/2005, O país, p. 3

Maurícia de Souza Santos, que perdeu os quatro filhos no deslizamento, foi da Bahia para o ABC com o marido, Gilson de Souza Oliveira. Ela disse que na hora do acidente não imaginou que o morro estivesse caindo. Disse que foi arrastada por uma mesa e uma pia e que bateu a cabeça. As vítimas estavam dormindo num beliche no momento do acidente.

A terra que derrubou o barraco atingiu a casa do primo de Gilson, o servente Edinilson Souza Dias, de 34 anos. Ele estava deitado, quando ouviu os gritos de outro vizinho, o caminhoneiro Vagner Trindade Ferreira.

¿ Tive de sair pela janela ¿ contou Edinilson, que acabara de voltar do hospital, onde fora visitar a mulher Regina Souza Dias, de 18 anos, internada para o nascimento da filha, Nataline. ¿ Se minha mulher estivesse em casa, acho que perderia a criança com o susto. E eu ficaria desesperado tentando salvá-la pela janela.

O servente pretende agora deixar a favela:

¿ Aqui não dá mais para ficar.

Maurícia vivia com os filhos Raí, Jair, Josiane e Roseane na favela há oito anos. Gilson é funcionário de uma empresa de perfuração de poços, viaja constantemente e não permitia que ela trabalhasse. As crianças freqüentavam uma escola municipal da região e gostavam de brincar na rua até tarde.

A família havia migrado de Santa Rita de Cássia, na Bahia. Gilson construiu o barraco, morou sozinho por um ano e só então chamou a família.

Outra vítima das chuvas é Juliano César de Oliveira, de 7 anos, que morreu após ter sido ferido por um caibro (peça de madeira usada em armações de telhado) do barraco em que morava na Vila Esperança, em São Bernardo do Campo. O barraco foi atingido por um deslizamento de terra, por volta das 2h30m de ontem. A família morava na casa, comprada por R$ 500, há cerca de dois anos.

Na hora do acidente, além de Juliano, dormiam no barraco a mãe do garoto, Ana Lúcia de Oliveira, o padrasto, a irmã e dois conhecidos da família.

Segundo o Instituto de Pesquisas Tecnológicas, o barraco não estava em área de risco e o acidente foi uma fatalidade. Parte de um barranco, de cerca de dois metros de altura, atingiu um compensado que servia de parede.

Segundo a irmã de Juliano, Maria Peçanha de Oliveira, o garoto foi ferido após ser atingido no tórax por um caibro. Ana Lúcia, com ferimentos na coluna, estava internada até ontem à tarde. A família quer ficar na casa de parentes enquanto o barraco é consertado.