Título: Eleição de Abbas aumenta otimismo nos territórios
Autor: Monica Yanakiew
Fonte: O Globo, 13/01/2005, O Mundo, p. 30/31

Os palestinos, a exemplo do discurso dos judeus que protestam contra a retirada dos assentamentos da Faixa de Gaza, também acham impossível um acordo baseado no que consideram uma violação dos direitos humanos. E tampouco comemoram a decisão do premier Ariel Sharon de sair de Gaza, mas por razões diferentes.

Para eles, não passa de uma hábil jogada política. Ao entregar agora o menor e mais pobre dos territórios ocupados, Sharon evitaria ter de fazer maiores concessões quando retomar as negociações de paz. E continuaria construindo assentamentos na Cisjordânia.

Sharon ¿ segundo qualquer palestino ¿ nunca quis e continua não querendo um acordo de paz. Se voltar à mesa de negociações é porque não tem alternativa. Seu maior argumento para evitar discutir a devolução dos territórios ocupados (inclusive Jerusalém Oriental), era Yasser Arafat. Mas o homem que Sharon chamava de terrorista morreu em novembro. Seu sucessor, o moderado Mahmoud Abbas, foi eleito presidente da Autoridade Nacional Palestina domingo, numa eleição democrática que a comunidade internacional considerou ser ¿um exemplo para o mundo árabe¿.

Palestinos têm ilusão de negociação mais justa

Enquanto os moradores dos assentamentos reclamam da traição de Sharon, eleito com a promessa de defendê-los, em Ramallah todos celebram a ¿democracia palestina¿. Ninguém acha que do dia para a noite estará vivendo numa Suíça. Eleito com cerca de 62,5% dos votos, Abbas não conta com a unanimidade para um projeto de paz, com instituições sólidas nem uma economia capaz de criar empregos e gerar bem-estar social. Mas as felicitações (sinceras ou não) da comunidade internacional criaram a ilusão de que, daqui em diante, a questão palestina será negociada quase que de igual para igual.

¿ Pela primeira vez no mundo árabe temos um presidente que assumirá com menos de 99,9% dos votos. Se tivermos sorte, este governo sobreviverá, como qualquer governo de qualquer democracia ocidental ¿ diz Ali Jarbawi, cientista político da Universidade Birzeit.

Nas ruas de Ramallah e Jerusalém, tanto palestinos quanto israelenses dizem querer paz. Mas a maioria não crê que seja possível e desconfia da mudança de atitude dos líderes políticos. Tanto da moderação do palestino Abbas quanto da dureza de Sharon com os moradores dos assentamentos, que ele no passado estimulou e defendeu. Na hora de discutir o que realmente interessa ¿ como dividir o mesmo pequeno pedaço de terra em dois países, com duas religiões ¿ surgirão os mesmos problemas de antes. Apesar dos belos discursos, garantem, a verdade é que ninguém quer ceder o que considera seu.