Título: Setor privado pede mais audácia nas reformas propostas pelo governo
Autor: Valderez Caetano
Fonte: O Globo, 17/01/2005, Economia, p. 17

A agenda microeconômica do governo ¿ elaborada pelo Ministério da Fazenda e divulgada na última semana de 2004 ¿ demonstra que Estado e setor privado estão desafinando: enquanto o governo quer ações tópicas, o setor privado pede mais audácia. Para entidades empresariais, analistas do mercado financeiro e economistas, as prioridades continuam sendo a redução do Estado, para estancar a sangria de gastos públicos, a reforma trabalhista e uma ampla reforma tributária, que altere o pacto federativo.

O governo acenou para o curto prazo, entre outras medidas, com projetos para regulamentar o banco de dados de proteção ao crédito, a abertura do mercado de resseguros, a autonomia operacional para o Banco Central (BC) e a unificação das regras do ICMS.

¿ É preciso dar um choque de produtividade no setor público. É grave o tamanho do Estado e seus gastos. Assim, não há como baixar juros. O setor público, que demanda muito dinheiro do mercado, compete com o setor privado pelo financiamento. A reforma tributária é prioridade absoluta, assim como a trabalhista ¿ diz o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro.

Agenda não pode descartar grandes reformas, diz Iedi

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva garantiu semana passada que a reforma trabalhista sai este ano, mas dentro do governo afirma-se que ele se refere apenas às mudanças na estrutura sindical, pois as correntes mais conservadoras do PT insistem em não abrir mão dos direitos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

Para o ex-diretor de Política Monetária do BC Sérgio Werlang, é preciso mais agilidade em medidas que definam com clareza o direito à propriedade, para dar mais garantias aos investidores. Ele cobra do governo a continuidade da privatização de bancos estaduais que estão federalizados. Na sua lista, figuram ainda reformas como a trabalhista, a sindical e a aprovação do projeto das agências reguladoras (também no cronograma da Fazenda):

¿ Vejo com otimismo, a despeito de todos os problemas ¿ disse Werlang, hoje economista-chefe do Itaú.

Para o especialista em contas públicas Raul Veloso, é difícil imaginar que um governo do PT não amplie o tamanho do Estado. Seria incoerente com o discurso histórico do partido, diz Veloso. Mas ele adverte que é preciso ficar atento para não haver intervenção na gestão macroeconômica.

O economista Júlio Gomes de Almeida, do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial (Iedi), diz que ninguém descarta a importância da agenda microeconômica do governo, mas lembra que o problema está no descarte das grandes reformas.

Abdib pede regras parao saneamento básico

Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, mostra preocupação com o crescente gasto da máquina do Estado. Segundo ele, o aumento do número de contratações no serviço público contribui para a burocracia e ineficiência da máquina. Além disso, inviabiliza a política de ajuste fiscal:

¿ O governo está criando uma rigidez dos gastos futuros.

A necessidade de regular o saneamento básico no país é lembrada pelo presidente da Associação brasileira da Indústria da Construção pesada (Abdib), Paulo Godoy. O setor também cobra medidas para a expansão do crédito, que estão na agenda do governo. Para o setor, as reformas trabalhista e tributária são essenciais para reduzir custos com mão-de-obra e impostos.