Título: INFLAÇÃO FECHA NO TETO DA META E GOVERNO É VILÃO
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Fonte: O Globo, 15/01/2005, Economia, p. 27

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que orienta o sistema de metas de inflação do governo, fechou 2004 em 7,60%, encostando no teto fixado de 8%, informou ontem o IBGE. É a primeira vez em três anos que o país consegue cumprir os intervalos de inflação determinados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O índice de dezembro, de 0,86%, acima das mais altas expectativas do mercado, fez o IPCA encostar no limite superior do alvo. Os preços administrados pelo governo foram o principal vilão: 40% dos 7,60% do IPCA vieram de tarifas como energia, telefone, gasolina, gás de cozinha e outras.

A principal pressão para a elevação do índice veio da gasolina. No ano, subiu 14,24% e, só em dezembro, 5,06%. Outros combustíveis, como álcool e óleo diesel, ajudaram a empurrar para cima a taxa:

¿ Foi o maior impacto tanto no ano quanto em dezembro. São três meses seguidos de reajustes. Mesmo assim, na refinaria, os aumentos somaram 23,30%. Isso indica que a concorrência e a demanda enfraquecida fizeram o repasse não ser total para os preços ao consumidor ¿ afirmou Eulina Nunes, gerente do Sistema de Índice de Preços do IBGE.

Analistas prevêem nova alta de juros este mês

Com a subida do índice no mês passado, de 0,69% de novembro para 0,86%, os analistas acreditam que a taxa básica de juros Selic (hoje em 17,75% ao ano) suba para 18,25% na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), na próxima semana.

Outro fator que levou os analistas a projetar nova alta dos juros veio dos núcleos de inflação, medidas que tentam retirar do IPCA os produtos que variam muito de preço. Em média, eles subiram de 0,59% em novembro para 0,67% no mês passado. E vêm se mantendo nesse nível desde setembro:

¿ Essa alta preocupa um pouco. Isso representa inflação anual de 8%, muito acima da meta de 5,1% perseguida pelo BC ¿ disse o economista Elson Teles, da Fides gestora de recursos.

Por isso, acredita numa elevação de meio ponto percentual na Selic este mês. Mas, para ele, o ajuste na política monetária pára aí. E, na opinião de Teles, a taxa de 18,25% deve permanecer por todo o primeiro semestre:

¿ Só na segunda metade do ano, os juros devem cair. Estamos projetando uma taxa de 16,5% no fim de 2005.

Os preços administrados ¿ tarifas públicas e combustíveis ¿ foram os vilões da inflação. Subiram 10,20% em média, contra 6,55% dos preços livres. A energia subiu 9,64% enquanto o custo da telefonia aumentou 14,76%. Este ano, essa pressão deve ceder, segundo o diretor de Estudos Macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Paulo Levy. Ele estima alta de 6,7% nos administrados este ano:

¿ Os índices que reajustam as tarifas devem ser menores.

Os preços dos combustíveis também devem ter comportamento mais estável este ano, e a telefonia não sofrerá o reajuste extra imposto pelo Supremo Tribunal Federal em 2004. A única pressão maior virá dos ônibus urbanos. As eleições municipais represaram os reajustes de 2004. Quatro capitais mantiveram preços das passagens.

¿ Certamente, as prefeituras vão tentar cobrir a diferença este ano ¿ afirma Teles, que já tinha observado esse comportamento há quatro anos.

Inflação dos mais pobres subiu menos em 2004: 6,13%

Com os preços comportados dos alimentos, que só aumentaram 3,60% no ano passado, a inflação dos mais pobres foi bem menor. Os preços da cesta de produtos consumida pelas famílias com renda até oito salários-mínimos, na qual a alimentação tem mais peso, subiram 6,13% em média. A inflação em 2004 foi pressionada por itens mais consumidos por famílias que ganham até 40 salários-mínimos: gasolina, telefone, automóveis novos.

Apesar de a alimentação não ter sido uma preocupação e a promessa de safra recorde reforçar essa idéia, a alta nos preços dos serviços preocupou em dezembro. Serviços médicos subiram 0,75%; laboratoriais, 0,77; e serviços pessoais, 0,94%:

¿ Um lado pode preocupar: a demanda mais aquecida. Porém há um lado bom: a recuperação da renda do trabalhador ¿ diz o professor da PUC Luiz Roberto Cunha.