Título: ESPERANÇA DE PAZ EM RISCO
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Fonte: O Globo, 15/01/2005, O Mundo, p. 32
Ogoverno de Israel anunciou ontem que cortou qualquer contato com a Autoridade Nacional Palestina (ANP) devido ao ataque a um posto de controle da Faixa de Gaza na noite de quinta-feira, que matou seis civis israelenses. O primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, adiou indefinidamente um encontro com o presidente eleito da ANP, Mahmoud Abbas, e ordenou o fechamento de todas as passagens entre Gaza e o mundo exterior.
De acordo com o governo israelense, os contatos só serão retomados após a ANP tomar medidas duras contra os grupos extremistas palestinos. O anúncio foi feito dias depois de um telefonema entre Sharon e Abbas, o contato de mais alto nível entre ANP e Israel em quase quatro anos.
¿ Israel está cortando todos os contatos planejados com os palestinos em todos os níveis, desde segurança até os dirigentes do governo ¿ disse Assaf Shariv, porta-voz de Sharon. ¿ Tudo está cancelado até que tomem medidas contra o terrorismo. Acabou o período de boa vontade que havíamos concedido a Abbas.
No ataque, uma bomba de 120 quilos foi detonada junto a um portão do posto que separa o lado palestino do israelense. Três guerrilheiros, então, dispararam morteiros e fuzis contra o local. Dos seis civis mortos, quatro trabalhavam no controle de mercadorias e dois eram motoristas de caminhão. Os guerrilheiros foram mortos por soldados. Hamas, Comitês de Resistência Popular (CRP) e Brigadas dos Mártires de al-Aqsa, este último grupo ligado ao Fatah, partido de Abbas, assumiram a autoria do ataque.
Segundo Israel, a decisão de cortar relações foi tomada porque ataque ao posto de controle de Karni foi feito a partir de uma base da ANP. O ministro da Defesa de Israel, Shaul Mofaz, alegou que a ação poderia ter sido evitada pela ANP uma vez que os três guerrilheiros tiveram que cruzar um posto de controle palestino antes de chegarem ao local. Abbas foi eleito no domingo e assumirá o cargo amanhã, substituindo Yasser Arafat na liderança palestina. Ontem ele condenou o ataque e também a recente incursão israelense aos territórios ocupados:
¿ Esta operação e as do Exército de Israel que mataram nove palestinos semana passada não contribuem para o processo de paz.
Num encontro na tarde de ontem com deputados árabes-israelenses, Abbas afirmou que não cumpriria as exigências de Israel de usar a força contra os grupos palestinos radicais. Ele disse que tentaria negociar uma trégua com eles. Uma carta assinada por Abbas, com o mesmo teor, também foi enviada para os ministro do Exterior de todos os países árabes.
Pela manhã, Mofaz e o chefe das Forças Armadas israelenses, Moshe Ya¿alon, anunciaram o fechamento, por tempo indeterminado, dos três postos de controle que ligam Gaza com o mundo exterior. Karni, local do ataque, é usado para a entrada e saída de comida, remédios e outras mercadorias. O posto de Erez é por onde passam a maioria das pessoas que transitam entre Gaza e Israel, como jornalistas e integrantes de entidades de ajuda humanitária. O terceiro posto, em Rafah, liga Gaza ao Egito e já estava fechado desde um ataque mês passado.
Batalha pelo poder entre palestinos
Segundo o general Avi Kochavi, comandante da Divisão de Gaza, a quantidade de alimentos e outros gêneros de primeira necessidade que terão a entrada permitida em Gaza será cortada drasticamente, mas o Exército tentaria fazer o possível para impedir o sofrimento da população civil.
¿ Por uma razão que não está clara para nós, (os guerrilheiros) estão fazendo esforços para destruir todas as tentativas de permitir que os palestinos, seu próprio povo, tenham uma vida mais fácil.
Segundo analistas, o ataque, feito quatro dias após a eleição do moderado Abbas ¿ um opositor da intifada armada contra Israel ¿ seria parte de uma luta pelo poder em Gaza entre os grupos radicais e a ANP. A participação de Hamas e dos CRP seria uma prova de força destes grupos em Gaza antes da posse de Abbas. A participação de uma facção do Fatah, os Mártires de al-Aqsa, poderia ser ainda mais perigoso para a estabilidade política palestina, pois demonstraria uma luta dentro do partido de Abbas.