Título: ALCKMIN TUNGA UM AEROLULA A CADA 266 DIAS
Autor: ELIO GASPARI
Fonte: O Globo, 19/01/2005, Opinião, p. 7

Aos fatos:

Em maio do ano passado a prefeitura petista de São Paulo criou uma nova modalidade de tarifa de transporte público. Chamou-se ¿Bilhete Único¿ e com ele um cidadão pode andar de ônibus por duas horas ao preço de R$1,70. Não importa a quantidade de vezes que embarca, nem o sentido em que viaja.

O número de viagens diárias feitas com o Bilhete Único já bateu a casa do milhão. Enfim uma boa notícia no andar de baixo de uma cidade onde, em 2003, cem mil pessoas faziam a pé, todos os dias, percursos de mais de uma hora de duração. Durante a campanha eleitoral essa iniciativa foi um dos estandartes da administração petista.

No dia 27 de outubro, dias antes do segundo turno da eleição, o programa de televisão do candidato tucano José Serra informava: ¿Com Serra na prefeitura o bilhete único será estendido ao trem e ao metrô.¿

Menos de duas semanas depois da posse de Serra, o governador Geraldo Alckmin, candidato à Presidência de República, impôs um aumento de tarifas anti-social. Suprimiu descontos que beneficiavam a patuléia.

As passagens de trem e metrô passaram de R$1,90 para R$2,10. O doutor Alckmin reclamou da compra do AeroLula, mas com essa tunga, a cada 266 dias ele toma da escumalha paulistana um ervanário equivalente ao preço do avião do companheiro. A conta: estimando-se que a cada dia são comprados três milhões de bilhetes na rede estadual, o aumento de R$0,20 rende R$600 mil. O AeroLula custou R$160 milhões. Com uma diferença: os impostos que pagam o Airbus saem do andar de baixo e do andar de cima. O aumento das passagens de Alckmin só avança no bolso de quem tem menos.

Pode-se argumentar que os aumentos de tarifas são necessários para manter o equilíbrio financeiro das empresas. Tudo bem. O aumento de 10,5% para o trem e o metrô, e de 14,8%, na média, para os ônibus intermunicipais ficou abaixo da inflação dos últimos dois anos, que passou dos 16%. No ano eleitoral de 2004 as tarifas ficaram congeladas. No de 2006 deverá acontecer o mesmo.

O estelionato tucano expressa-se numa segunda característica do aumento. Um partido que prometia a extensão Bilhete Único praticou o oposto: restringiu o pequeno desconto que oferecia, usufruído por cerca de 50% dos usuários. Os passageiros da rede de transporte dos tucanos pagavam R$3,60 pelo bilhete que cobria duas viagens. (Uma economia de R$0,10 por percurso.) Alckmin simplesmente confiscou a vantagem. Para quem compra bilhetes de dez viagens, mordeu-se metade do desconto. Era de R$2 e passou a R$1.

Não se trata de ter esquecido uma promessa eleitoral. O PSDB prometeu uma coisa e fez o contrário. Prometeu transporte mais barato e deu transporte mais caro, tungando descontos.

Não se pode dizer que José Serra seja responsável pela tunga. Beneficiário, não é. Pode-se afirmar que durante a campanha eleitoral e até o início deste mês, a propaganda oficial de Alckmin (paga pelos impostos da patuléia dos trens) sugeria que seu governo fazia coisa semelhante ao Bilhete Único. Dizia que com um só bilhete viaja-se centenas de quilômetros. Deixava de informar que se paga por cada percurso.

Alckmin e sua ninhada tucana devem achar que os cartões de crédito também são ¿bilhetes únicos¿. Afinal, com um único cartão pode-se comprar uma roupinha na Daslu, um carrinho na revendedora da Audi e sandálias Havaianas personalizadas no Shopping Iguatemi. Como tucano não anda de ônibus, a confusão é compreensível.