Título: LULA PARA FURLAN: `NÃO FALTARAM PESSIMISTAS¿
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Fonte: O Globo, 20/01/2005, Economia, p. 23

Quatro dias depois de o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, criticar duramente a política externa do governo nas páginas dos jornais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu o troco. Diante de um público de pequenos, médios e grandes empresários, ministros, parlamentares e sindicalistas, Lula fez uma defesa veemente do objetivo internacional do Brasil. Olhando para Furlan, chamou de pessimistas os críticos. Disse ainda que a atual política não afasta o Brasil dos parceiros tradicionais ¿ Estados Unidos e União Européia ¿ mas aproxima de grandes mercados consumidores como China, Rússia e Oriente Médio:

¿ Nunca tivemos idéia ou intenção de brigar com os EUA, até porque seria quase como rasgar nota de US$100, já que eles são, individualmente, o melhor parceiro comercial nosso. Jamais seríamos loucos de brigar com a União Européia, sem lembrar a importância que eles têm: a de investimentos aqui e a de compras dos produtos brasileiros.

A defesa da política externa foi feita durante a posse do petista Paulo Okamotto na presidência do Sebrae. Na cerimônia, o presidente se mostrou impaciente, tamborilando os dedos sobre a mesa durante os discursos. Por isso, não se conteve e, após ler seu discurso, desabafou de improviso.

¿ O Furlan sabe que não faltaram pessimistas. Eles diziam que, com esse negócio de o país estar se metendo a fazer parceria estratégica com China, Índia, África do Sul, Oriente Médio, procurando integrar a América do Sul, criando o G-20, iríamos arrumar uma briga com os Estados Unidos e isso, diziam, não seria bom para o Brasil ¿ disse Lula, dando a entender que já há críticas suficientes de fora do governo.

Furlan pareceu incomodado com o discurso do presidente, tanto que a primeira-dama, Marisa Letícia, fez comentários no ouvido do ministro para deixá-lo mais à vontade. O próprio presidente tratou de amenizar o clima, passando em seguida a tecer rasgados elogios a Furlan ¿ mas sempre lembrando-o de que ele tem funções dentro do governo e que a idéia é somar esforços.

Mantendo o estilo de fazer comparações com o futebol, Lula disse que em algumas negociações Furlan se comporta como o então zagueiro do São Paulo, Procópio, encarregado de marcar Pelé no Santos. Lula afirmou que enquanto ele próprio fez mais de 35 viagens ao exterior, Furlan fez 50 em busca de novos mercados.

¿ Vivemos um pouco, quem sabe, da minha experiência sindical e, quem sabe, da experiência de negociador do Furlan. Antes de ganhar as eleições, eu queria um mascate para uma secretaria especial de comércio exterior. Eu sempre trabalhei com a imagem do mascate ¿ disse Lula, mais uma vez se dirigindo ao ministro do Desenvolvimento.

Lula quer Paris tomada por produtos brasileiros

O presidente, então, detalhou o sucesso da linha de atuação de sua política externa, citando como o Brasil vem ganhando mercado para produtos antes de consumo nacional, como a manga. Lula disse que o próximo passo, depois de convencer o Japão a comprar manga brasileira, é a venda de carne para a China.

Ele anunciou ainda que a semana brasileira na França ¿ que se realizará em julho, dentro das comemorações do Ano Brasil no país europeu ¿ não vai se restringir a eventos oficiais. Lula quer que os empresários brasileiros invadam Paris com produtos nacionais.

A referência do presidente à negociação para venda de manga ao Japão foi o único momento em que o ministro Furlan se descontraiu. Ele riu da brincadeira de Lula:

¿ Há 27 anos o Brasil tentava vender manga para o Japão e eles não compravam por preconceito contra o bicho da manga. Nós, aqui no Brasil, não estamos ligando: comemos com tudo. Quando o primeiro-ministro veio ao Brasil, servimos manga de sobremesa. Depois, churrasco para os chineses.

Para Lula, o Brasil deixou de jogar na defesa e partiu para o ataque na política externa.