Título: Partidos fracos
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 21/01/2005, Panorama Político, p. 2

Agora que estão postas cinco candidaturas à presidência da Câmara, contando-se a do deputado direitista Jair Bolsonaro, à qual ele mesmo atribui o mero sentido do protesto, há que se entender o significado de tamanha, embora não inédita, contestação à regra e à tradição. Há sentidos diferentes em cada candidatura e um aviso mais agudo é dado pela do petista Virgílio Guimarães.

Aos eleitores representados pela Câmara, que pouco devem estar entendendo desta briga de foices, teria utilidade a proposta que desde anteontem o candidato avulso do PFL, José Carlos Aleluia, tenta encaminhar a seus concorrentes: que debatam publicamente suas propostas, suas diferenças e o objetivo de cada candidatura:

¿ De minha parte, não discuto salário de deputado nem estou contando votos. Temos que discutir é o papel do Parlamento, que vem perdendo credibilidade a cada nova pesquisa ¿ diz Aleluia, que pediu também à TV Câmara a iniciativa de promover o debate.

Mas os partidos parecem considerar a composição da Mesa um assunto de natureza interna, a ser resolvido entre eles, observando-se o regimento e a tradição, que estabelecem a regra da proporcionalidade entre as bancadas. Os partidos, inclusive o PFL de Aleluia, curvam-se aos cânones quando estão em situação favorável, contestando-os quando estão na oposição e na adversidade. Virgílio Guimarães, que desconcerta o PT com sua candidatura avulsa, será a estrela de um grande ato político amanhã em Belo Horizonte, onde espera a participação de sete mil pessoas. Tal ato de rua em defesa de sua candidatura tem o mesmo sentido do debate proposto por Aleluia, o de envolver a sociedade numa disputa restrita ao próprio Congresso. Mas haverá mesmo este ¿comício¿ em Minas, onde a candidatura de Virgílio vem traduzindo a eterna vocação insurgente dos mineiros. Agora, contra os paulistas e o centralismo fiscal da União. Um dos discursos recorrentes do governador tucano Aécio Neves, pela revisão do pacto federativo, está na boca de Virgílio. Se ele é punido pelo PT, vira um Tiradentes.

Ao candidato oficial, entretanto, não interessa este jogo para abrir a arena da decisão, restrita às cúpulas dos partidos e ao ramal político do governo. Isso é em todos os tempos. Luiz Eduardo Greenhalgh, candidato oficial de agora, está é correndo atrás de votos. Ontem esteve em Goiânia, reuniu-se com o governador Marconi Perillo e deputados tucanos, com o prefeito Íris Resende, o senador Maguito Vilela e deputados do PMDB. Diz ter sido muito bem recebido pelos dois grupos. Seguiu para Cuiabá, onde jantou com as bancadas do estado depois de visitar o governador Blairo Maggi, do PPS.

¿ Estou trabalhando e assim seguirei, com todo o respeito pelas outras candidaturas ¿ diz ele.

Mas uma coisa é certa: tantas candidaturas são um sinal estridente de debilidade dos partidos. A propósito das candidaturas avulsas, José Genoino, presidente do PT, diz que elas ¿minam e desrespeitam a força dos partidos, fortalecendo uma perspectiva individualista e personalista da representação política¿, contrária à democracia. Mas algo os partidos fizeram ou vêm fazendo para produzir o fenômeno.

Genoino esclarece um comentário saído aqui: o PT nunca patrocinou candidaturas avulsas, diz ele. No passado, lançou candidaturas alternativas, aprovadas pelo partido, contra a de outro partido. Mas admite que também isso foi contrário à regra da proporcionalidade entre as bancadas.

Lula, os vizinhos e os EUA

Prosperam os esforços do presidente Lula para facilitar a reaproximação entre os presidentes brigões, Chávez, da Venezuela, e Uribe, da Colômbia. Os Estados Unidos, entretanto, parecem não ter gostado da água benta de Lula. Fizeram chegar ao Planalto uma nota oficial sobre o assunto, destacando a mediação que já vem sendo feita pelo Peru e pela Comunidade Andina, e fazendo duras cobranças a Chávez.

Lula falou por telefone ontem com Chávez, na seqüência de sua conversa com Uribe, anteontem em Letícia. A conversa não foi fácil mas terminou com Uribe aceitando as gestões do Brasil junto a Chávez, que vem exigindo um pedido de desculpas da Colômbia pela prisão e seqüestro de um guerrilheiro das Farc na Venezuela, o que tomou como violação de soberania. Antes da conversa com Uribe, o chanceler Celso Amorim conversara por telefone, voltando da África, com os chanceleres dos dois países.

Chávez ontem estava mais dócil e menos exigente. Marco Aurélio Garcia, assessor internacional de Lula, estará em Caracas amanhã, numa viagem preparatória da visita do presidente à Venezuela e ao Suriname. Ali, a missão de paz deve ter novos desdobramentos.

Mas a nota do governo americano não poupa Chávez, exigindo que ele deixe de impor condições para a reabertura do diálogo e esclareça a existência de outros guerrilheiros no país.

SE O PMDB quiser, que faça sua paz interna. Mas Lula, de sua parte, continuará negociando apenas com o grupo governista de Renan, Sarney, Borba e Eunício. Acha que o outro lado cobra muito caro para não entregar o que promete. Mas ele também nada prometeu ontem aos peemedebistas. Ministérios, só depois do desfecho da briga na Câmara.