Título: Disciplina mais rígida gera crise na Febem
Autor: Adauri Antunes Barbosa
Fonte: O Globo, 21/01/2005, O País, p. 10

A implantação do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) na Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), impondo restrições semelhantes às existentes nas penitenciárias de segurança máxima do estado de São Paulo, foi o estopim para uma nova crise na instituição. O agente técnico Marcelo Jorge Fayad, ex-diretor da unidade 41 da Febem, uma das três do complexo da Vila Maria (Zona Norte da cidade), acusou ontem o secretário estadual de Justiça e presidente da Febem, Alexandre de Moraes, de ter organizado a rebelião ocorrida na semana passada na unidade, incriminando funcionários pela prática de tortura contra os menores.

A Febem contestou as acusações do ex-diretor, afastado do cargo, segundo a direção, por responder a sindicância na qual é acusado de espancar menores em outra rebelião, no dia 22 de novembro do ano passado. O promotor Alfonso Prestes, do Ministério Público Estadual, que acompanha a apuração dos espancamentos na Vila Maria, endossou a versão do governo e afirmou que Fayad foi reconhecido como um dos torturados pelos meninos espancados.

Agente diz que adolescentes reagiram e deram pauladas

Em entrevista na sede da Central Única dos Trabalhadores (CUT), à qual o sindicato da categoria está vinculado, Marcelo Fayad afirmou que, mesmo de férias, foi convocado para colaborar na seleção dos funcionários que atuariam no RDD, cuja implantação, segundo ele, não poderia acontecer porque dependeria da autorização de portaria.

Para a Febem, não houve irregularidade. A instituição diz que o RDD é garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê sistema diferente para maiores de 18 anos que cometem delitos mais graves e têm compleição física maior. A Secretaria de Justiça prepara cinco unidades onde será implantado o RDD.

Fayad disse que a direção da Unidade Vila Maria da Febem confirmou que o RDD começaria naquele dia. Mas, disse ele, dos três pelotões de choque da Polícia Militar convocados para dar apoio à operação, apenas um estava presente. Mesmo sabendo dos riscos, a direção teria autorizado a operação.

¿ Quando o pelotão de choque entrou na primeira unidade, os internos das outras acordaram. Os funcionários foram forçados a entrar antes do pelotão de choque e os adolescentes reagiram com muita agressão, dando pauladas ¿ disse o agente sobre a confusão do dia 11.

Para a Febem, as denúncias de Fayad são uma tentativa de desviar o foco para o fato dele estar afastado do trabalho e responder à sindicância que pode concluir pela sua demissão sem justa causa. Ainda de acordo com a Febem, o choque da PM nem foi chamado, já que o ambiente estava calmo. Antes da revista feita pelos funcionários, o grupo de apoio da Febem revistou quartos e internos para certificar-se de que não havia armas na unidade. Só então os funcionários entraram.

O presidente da CUT, Luiz Marinho, disse que, se a invasão da PM foi comandada pelo chefe de gabinete do secretário da Justiça, é fato muito grave.

¿ Se é verdade, é caso de demissão do secretário e reabertura da CPI da Febem na Assembléia ¿ disse Marinho. Para ele, o governo trata os funcionários da Febem ¿como um bando de torturadores¿.

De acordo com Fayad, alguns dos funcionários presos acusados de tortura nem estavam na unidade no dia da rebelião.

¿ Os laudos comprovam que 84 adolescentes foram espancados. Resta-nos apurar quem praticou as lesões ¿ disse o promotor Alfonso Prestes, lembrando que Fayad foi reconhecido como um dos espancadores.