Título: Música, vigília e poesia contra Bush na Europa
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 21/01/2005, O Mundo, p. 26

O anúncio em Paris dizia: ¿Bush não vai embora. E nós também não!¿ Foi assim que jovens democratas americanos, inconformados com a reeleição de George W. Bush, convocaram ontem à noite os parisienses para um baile de protesto num dos bares da moda de Paris, o Xtremes, com a recomendação de que fossem vestidos de azul, a cor do derrotado candidato John Kerry. Ocasião para ouvir música, tomar drinks e, sobretudo, falar mal do presidente.

Paris ¿ capital anti-Bush, por excelência ¿- não foi o único lugar. Por toda a Europa, americanos e locais se uniram em sinal de protesto ou para se consolarem diante do fato consumado. Em Londres, enfrentaram o frio num protesto com velas do lado de fora da embaixada americana. Em Genebra, organizaram um jantar para a leitura de poemas patrióticos. Em Viena, membros do grupo Democrats Abroad marcaram encontro num bar de vinhos com o objetivo de ¿organizar e planejar a retomada do país¿.

¿ Não podemos só engatinhar rumo ao buraco. Temos que ir em frente e usar nossa raiva como base para avançar ¿ disse a presidente do grupo na Áustria, Kristin Smeral.

Blair dá a entender que não será tão dócil

Em Londres, ativistas do grupo Stop the War Coalition, vestidos de preto, fizeram vigília com cem velas na porta da embaixada dos EUA, deixando um caixão ¿para lembrar os que morreram desnecessariamente nas mãos do governo Bush¿.

¿ Vivemos um momento perigoso sem paralelo. Não satisfeito em destruir uma nação soberana, o governo Bush está tocando os tambores da guerra novamente ¿ disse Lindsey German, líder da organização.

Manifestantes na Alemanha começaram os protestos na quarta-feira, em Berlim, quando milhares se reuniram, à noite, no portão de Brandenburgo.

¿ As pessoas estão alarmadas. Achamos que muitos alemães ficariam felizes em saber que muitos americanos não concordam com Bush ¿ disse Elsa Rassbach, do American Voices Abroad, na Alemanha.

Opositores também organizaram ¿antibailes¿ em Praga, na República Tcheca. E em Genebra, uma festa de protesto ia começar com a leitura de um poema de Langston Hughes chamado ¿Deixe a América ser a América de novo¿.

Em Londres, o primeiro-ministro Tony Blair deu mostras de que não será tão passivo diante da política externa dos EUA. Numa entrevista ao ¿Guardian¿, o premier britânico, principal aliado dos americanos na guerra contra o terror, disse ter esperanças de que o segundo mandato de Bush seja mais marcado pelo consenso do que o anterior. Para Blair, o governo Bush teria aprendido com experiências como as invasões de Afeganistão e Iraque que o poderio militar não é suficiente para garantir segurança e paz.

¿ A evolução vem com a experiência e, a meu ver, o governo Bush concluiu que até se pode tomar medidas militares contra o terrorismo, mas que o melhor prospecto para uma coexistência pacífica está na promoção de democracia e direitos humanos ¿ disse Blair.

Entre árabes e muçulmanos, o novo mandato foi recebido com inquietude, temor e uma tímida esperança. Mas os políticos preferiam falar ¿da necessidade de mudança¿ na política externa americana.

¿ O sentimento generalizado, tanto entre políticos como na população, é o pessimismo. Poucos esperam mudanças significativas. Mas ninguém quer renunciar à esperança ¿ disse Emad Eldin Shahin, professor de ciências políticas da Universidade Americana do Cairo.