Título: A BOLSA E OS BOLSÕES
Autor:
Fonte: O Globo, 20/01/2005, Panorama Político, p. 2

Ao incluir o Brasil entre os países que podem cumprir as Metas do Milênio até 2015, reduzindo substancialmente a pobreza, a ONU nos dá uma notícia. Pelo menos, estamos no rumo certo. O relatório, entretanto, sugeriu mudanças no foco geográfico das ações sociais, através da concentração de esforços e recursos em 13 bolsões de pobreza situados nas periferias dos grandes centros urbanos.

Não é isso o que acontece com o mais importante programa de transferência de renda do governo, o Bolsa Família, que destina ao Norte e ao Nordeste quase a metade de seus recursos, dirigindo-os não apenas aos grandes bolsões urbanos de pobreza mas também aos pequenos municípios do interior. A meta do governo é nacionalizar o programa, alcançando a totalidade dos municípios. Tanto é que, para isso, faltam apenas 33.

Patrus Ananias, ministro do Desenvolvimento Social, diz que ainda está examinando minuciosamente os estudos da ONU, tanto o do economista Jeffrey Sachs quanto o do representante do PNUD no Brasil, José Carlos Libânio. Mas preliminarmente, não discorda da recomendação, lembrando que ao assumir a pasta, em 2003, recebeu do presidente Lula a orientação para intensificar as ações sociais nas grandes periferias pobres. Neste sentido, logo que assumiu buscou parcerias com os governadores do Rio e de São Paulo e com os prefeitos das capitais e cidades das respectivas regiões metropolitanas.

¿ Este é o nosso objetivo, mas sem perder de vista o caráter nacional das políticas sociais e também a meta de reduzir as desigualdades regionais ¿ diz ele.

Mas vejamos a quantas anda a geografia do Bolsa Família. Um estudo da professora Rosa Maria Marques, da PUC de São Paulo, a pedido do governo, mostra o impacto positivo dos programas de transferência de renda sobre a vida nos municípios: quanto menor a renda local, mais o dinheiro da bolsa faz diferença. Este mesmo estudo demonstra que o Norte-Nordeste concentra a maioria dos beneficiados pelo programa, 63% do total, sendo que 54% no Nordeste. Em cada dez famílias atendidas, seis estão nas duas regiões. No Nordeste ocorrem também os maiores percentuais de atendimento em relação à população total. Estes índices variam de 13% (Timbaúbas-RN) a 45% (Várzea-PE). Os nove estados nordestinos concentram 46,9% dos pobres do Brasil, e, segundo o estudo, 54% de suas famílias são atendidas pelo Bolsa Família.

Os treze bolsões de miséria apontados pela ONU alcançam 600 municípios e neles vivem 26 milhões de pessoas. A maior parte deles fica no Centro Sul, sobretudo nas periferias de Rio e São Paulo, onde vive o maior número de pessoas em estado de pobreza extrema, com menos de US$1 por dia. Pobreza é pobreza no interior ou nas metrópoles, mas nestas últimas ela tem desdobramentos mais graves, como a violência.

O governo, diz Patrus, está aberto ao exame das sugestões, da mesma forma como vem se esforçando para aperfeiçoar os mecanismos de fiscalização em função das denúncias de irregularidades e das críticas. Hoje, ao lado de Lula, ele assina convênio com o Ministério Público no sentido de aumentar a transparência e o controle.

¿ Importante é que estamos avançando, como reconhece a ONU. Avançamos no governo passado, continuamos avançando no atual governo e assim vamos cumprir as Metas do Milênio ¿ diz ele.

Mas, para isso, como recomenda a ONU, será preciso apertar o passo.